Da cidade de Goiás – Único longa-metragem goiano na 18ª Mostra Competitiva do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental de Goiás (Fica), Taego Ãwa recupera um dos capítulos mais traumáticos da história da colonização do Brasil Central. Dirigido pelos irmãos Marcela Borela e Henrique Borela, o documentário contrapõe o processo de desterro do grupo Avá-Canoeiro do Araguaia no início dos anos 1970 às condições de vida atuais dos indígenas. O longa foi exibido na sexta-feira, 19, na cidade de Goiás, no Cinemão.
A narrativa tem como ponto de partida algumas fitas VHS que foram encontradas por Marcela Borela na Universidade Federal de Goiás. Em 2014, a equipe do filme foi à aldeia dos Avá-Canoeiro na Ilha do Bananal, guiada por Tutawa Tuagaèk Jamagaèk Ãwa, líder xamã falecido em junho de 2015. O líder e seus familiares que sobreviveram ao contato forçado com a Funai nos anos 70 recordam as atrocidades vividas – ele mesmo perdeu o pai, assassinado por outros homens brancos, ainda na primeira metade do século 20. Essas perdas remontam a um passado repleto de perseguições desde os séculos 18 e 19, às quais os Avá-Canoeiro resistiram bravamente, justificando sua fama de povo arredio.
Materiais de arquivo da época ajudam a entender o processo violento e sistemático que quase levou os Avá-Canoeiro à extinção, como nas cenas que mostram os índios num cercado e expostos à visitação pública. Coincidindo com as ações governamentais de 40 anos atrás, há o avanço veloz das fronteiras da atividade agropecuária no Centro-Oeste, de forma legal ou ilegal, enquanto a imprensa do período ainda tratava a questão indígena com bastante preconceito, justificando as ações autoritárias e etnocêntricas, muitas de cunho criminoso e de claro interesse econômico.
Porém, o filme vai além dos clichês do cinema etnográfico. As ricas entrevistas realizadas pela equipe e a própria estética do documentário acabam trazendo à tona outros elementos da cultura do povo Avá-Canoeiro, sua religião, seus códigos sociais, a arte e sua maneira de se relacionar com o meio ambiente. Embora suas terras tenham sido demarcadas recentemente, é difícil não lamentar o processo de degradação da tribo ao longo de séculos de colonização.
A colunista de ERMIRA viajou a convite da organização do festival