De San José (EUA) – A um dia do término da temporada de The Swings (Os Balanços) em San Jose, ao sul de San Francisco, no Vale do Silício, fui conferir uma das mais aplaudidas instalações artísticas criadas pelo estúdio canadense de design Daily Tous Les Jours, com sede em Montreal. Confesso que esse tipo de criação nunca chamou muito minha atenção, mas esta em especial quis conferir pela sua proposta de interatividade e ocupação de um espaço público. Não me enganei. O envolvimento do público, e o meu também, claro, com os balanços fez tudo valer a pena.
O Daily Tous Les Jours criou uma proposta juntamente com o professor de comportamento animal Luc-Alain Giraldeau, da Universidade de Quebec. Eles exploraram o conceito de cooperação. A ideia original surgiu em 2011 como 21 Balançoires (21 Balanços), que desde então estão instalados no Quartier des Spectacles, em Montreal, com uma média de 8.500 oscilações diárias. A área abrange oito espaços públicos com programação cultural, 80 espaços de cultura e 450 empresas voltadas para o segmento.
Ponte entre físico e digital
O The Swings é apenas uma pequena amostra do que o surpreendente Daily Tous Les Jours vem fazendo desde a sua fundação em 2010 por iniciativa de Mouna Andraos e Melissa Mongiat, jovens criadoras. A equipe, bastante jovem, cresceu muito ao longo dos últimos seis anos e cada vez mais ganha reconhecimento sem fugir de sua maior proposta: o design de interação com foco na ocupação de espaços públicos.
O trabalho do estúdio já ganhou vários prêmios internacionais, como o Interaction Awards, em 2013; o Unesco Shenzen Design Awards, em 2014; o Knights Cities Challenge Global Innovators, em 2015. Este ano foi um dos vencedores do Fast Company Innovation by Design.
Inúmeros blogs e revistas dedicados ao design também já reservaram espaços generosos ao Daily Tous Les Jours. Membros da equipe recebem convites de todo o mundo para workshops e palestras sobre o trabalho pautado na criação de experiências coletivas.
Em junho deste ano, durante o New Cities Summit, em Montreal, que teve como tema central A Idade da Tecnologia Urbana, o estúdio foi convidado a ministrar um workshop. Os responsáveis utilizaram como ponto de referência os 21 Balançoires, projeto com histórico de impactar positivamente espaços públicos. Depois de analisar o ambiente e os transeuntes, os 50 participantes sugeriram várias possibilidades de novas interações unindo o físico ao digital.
Há cinco anos milhares de adultos, de crianças, de famílias inteiras se divertem ali com a proposta de fazer música brincando, ou seja, balançando. E em 2014 os balanços – cópias deles – começaram a viajar para a alegria de muita gente que ainda não teve a oportunidade de conhecer Montreal.
Em San Jose, sob a responsabilidade do The Tech – Museu de Inovação, The Swings foi instalado no início de agosto na Praça César Chavez, no coração da cidade, durante o Festival de Verão de Jazz. Depois, vieram outros eventos por ali, como a Meia Maratona de San Jose e um festival de rock que contribuíram para o acesso de milhares de pessoas à instalação.
Fiquei observando a reação de três adolescentes ao experimentar os balanços. Uma jovem, ao ouvir o som que criou, fechou os olhos num sentimento de regozijo. “Gostou da experiência?”, perguntei. “Muito. É impressionante!” Veja abaixo o vídeo de pais e filhos tirando o máximo proveito da instalação.
Impossível ficar alheio à instalação. Utilizados separadamente, os dez balanços emitem notas musicais, mas oscilando juntos são capazes de produzir uma peça musical inteira. São melodias suaves e envolventes. A proposta do estúdio canadense é que haja uma cooperação entre os usuários de espaços públicos para encantar a vida cotidiana e estimular encontros lúdicos. Em San Jose muitas pessoas, talvez intimidadas em usar os balanços, se sentavam diante deles somente para ouvir a música e observar a reação dos participantes.
Quando os balanços são movimentados para frente e para trás, cada um emite um som de quatro instrumentos – piano, harpa, guitarra e vibrafone. A melodia surge através da cooperação entre os jogadores e eles podem alterar a nota cada vez que balançam mais alto.
Sombras e sensações
O Daily Tous Les Jours também assina o projeto permanente intitulado Mesa Musical Sombras, inaugurado em abril deste ano no Mesa Arts Center, um complexo artístico localizado perto de Phoenix, no Arizona. As sombras geradas pelo movimento do público na praça são captadas por sensores instalados sob telhas geométricas de concreto coloridas que respondem com mudanças na iluminação. Estas, por sua vez, acionam diferentes sons melódicos ou de percussão formando uma composição. As pontuações musicais mudam dependendo do período do dia, que alongam ou não as sombras.
Outro projeto bastante interessante do estúdio e que já foi mostrado em algumas cidades norte-americanas como San Francisco e Nova York é o Food Sessions, de 2015. Trata-se de uma instalação pop-up em que os participantes são convidados a partilhar uma refeição enquanto são guiados por auscultadores sem fios que os levam a uma experiência sensorial, de memórias e de emoções associadas com a comida que estão comendo.
A criação do Daily Tous Les Jours, premiada este ano no Fast Company Innovation by Design, foi uma encomenda para a empresa de brinquedos eletrônicos educativos littleBits que até o ano passado vendia exclusivamente on-line. O estúdio foi convidado a projetar em Nova York a primeira loja de varejo pop-up para permitir que, ao longo de seis meses, a empresa pudesse entender melhor a relação entre os clientes e seus produtos.
Mais uma vez, a experiência compartilhada foi utilizada num rico processo de interação de adultos e crianças atraídos pelos componentes littleBits. “O espaço funcionou não só como uma entidade comercial, mas também como uma oficina, um laboratório, um local para a colaboração, dissolvendo o conceito da tecnologia que consome e a tecnologia que inventamos”, disse Pierre Thirion, designer de interação que anunciou o prêmio no site do estúdio.
A vontade de ficar ali, balançando por um tempão, é enorme, e por isso o uso da instalação tem regras. Nos horários de pico, a pessoa só pode ajudar a fazer música durante cinco minutos. Nunca deve ficar em pé nos balanços e os pais precisam sempre estar por ali, de olho nos filhos. Por todos os lugares por onde a instalação passa, voluntários se unem para que as regras sejam cumpridas.
“A cooperação surge quando o comportamento de cada indivíduo depende das decisões do resto do grupo. É um jogo onde, desde o início, você precisa ajustar-se às ações dos outros. Os balanços são uma instalação de arte de mídia nova, não um playground. Eles permitem que os participantes façam música com seus corpos ligados um ao outro e tenham um senso de propriedade do espaço público devido a essa música”, explicam os fundadores do estúdio.
Este ano, além de San Jose, The Swings esteve em outras cidades norte-americanas como Nova York, Detroit e Palm Beach. Essa versão itinerante estreou há dois anos durante um festival de artes em Green Mountain Falls, no Colorado.
Os balanços são aplaudidos e usufruídos porque, segundos seus idealizadores, criam um sentimento de propriedade, de transformar um espaço num lugar em que as pessoas querem ser. Também porque criam sociabilidade entre os cidadãos, ajudam a quebrar barreiras, reduzem tensões e criam oportunidades de contato. E, principalmente, porque incentivam as pessoas a cuidar do seu ambiente. “Quanto mais os cidadãos passam tempo em espaços públicos, mais eles se preocupam em cuidar desses lugares.”
Cara Malu Longo, das jornalistas brasileiras que moram em São Francisco, você é a que eu mais gosto. Parabéns pela bela matéria.