De Hanói (Vietnã) – Um país marcado pela guerra e que pode se orgulhar de ter sobrevivido a conflitos e genocídios. Um país de povo hospitaleiro, extremamente educado, cortês, com gestos de atenção para todos. Um país que está no imaginário de muita gente, que esteve no centro dos debates geopolíticos mundiais por mais de uma década, mas que se mostra surpreendente diante dos estereótipos que o cercam. Este é o Vietnã, uma nação cheia de história, de um passado traumático, de um presente paradoxal e de um futuro que sua população espera que seja melhor. Um bom emblema de tudo isso é Hanói, a capital econômica do país asiático.
O comércio é a principal atividade da cidade, com áreas bastante movimentadas por lojas de todos os gêneros, com destaque para aquelas que vendem roupas e acessórios. O mercado municipal reúne todos esses negócios que já integram a essência desse centro urbano que parece caótico, mas não é. As ruas são estreitas e nelas está uma das maiores particularidades de Hanói. O trânsito é amplamente dominado por pequenas motos, lambretas que parecem existir em número maior que o de pessoas no Vietnã. Na verdade, a população local se motorizou. Antes andavam de bicicletas, o que ainda é possível ver com facilidade nas zonas rurais.
É preciso muita atenção ao andar a pé por Hanói, já que são raros os cruzamentos que contam com semáforos. Os condutores, com a mão na buzina, vão abrindo caminho pelas vias públicas, mas sem pressa. É o conceito do trânsito acalmado, em que todos parecem não se respeitar, mas acabam se entendendo no final das contas. A prova de que isso dá certo é que o número de acidentes é irrisório e, quando acontecem, são pequenas colisões sem maiores consequências. Todo mundo buzina, mas não é fácil ver alguém discutindo com outros motoristas, se xingando publicamente. Talvez devêssemos olhar com mais atenção para esse modelo de (des)organização do tráfego.
Uma história traumática
O Vietnã tornou-se palco de grandes conflitos a partir da Segunda Guerra Mundial. Na época, o país asiático era uma colônia francesa, mas despertava interesse também de seus vizinhos. Durante o confronto global, o Japão invadiu seu território, estimulando a população local a se insurgir tanto contra o invasor, quanto contra a metrópole europeia. Se Aliados e potências do Eixo fizeram o Vietnã – e também Laos e Camboja – um palco militar, ocorreu o mesmo já na Guerra Fria. As potências capitalistas e comunistas dividiram o lugar em dois e armou o cenário de mais banhos de sangue. E eles vieram.
Nos anos 1950, um golpe de Estado impediu a unificação entre Vietnã do Sul e Vietnã do Norte, acirrando antigas mágoas e rixas locais. Os EUA passaram a apoiar o Vietnã do Sul, enquanto a extinta União Soviética dava amparo militar e político para o regime socialista que se instalou no Vietnã do Norte. As hostilidades se acumularam até que, em 1965, um bombardeio de barcos no Golfo de Tonquim foi o gatilho para a intervenção norte-americana na região, dando início à fatídica Guerra do Vietnã.
O que se vislumbrava como um passeio das poderosas forças armadas dos EUA transformou-se num pesadelo. Com táticas de guerrilha e muita astúcia, os vietnamitas impuseram muitas baixas às tropas americanas. Por outro lado, o Vietnã do Norte avançou pela parte sul e tomou Saigon (hoje chamada Ho Chi Min) em 1968, na chamada Ofensiva do Tet. Mais de 60 mil combatentes mortos, muitos outros feitos prisioneiros e o uso indiscriminado de armas de destruição em massa contra civis desgastaram a guerra para os próprios americanos. Depois de anos de protestos e muita pressão internacional, os EUA se retiraram do Vietnã unificado sob o regime comunista, que também foi sangrento.
A cidade é muito agradável. No centro, há um grande lago, chamado Hoan Kiem, em que vive uma lendária tartaruga gigante, com séculos de idade, considerado animal sagrado por lá. O bicho participa de muitas lendas da cultura vietnamita e que são reproduzidas em teatros de bonecos. Em outros pontos de Hanói e de seus arredores há marcas da antiga guerra, mas as provocações aos Estados Unidos ficaram no passado. A globalização falou mais alto. Os turistas americanos – e seus dólares – são muito bem-vindos, mesmo o país sendo, oficialmente, comunista. É um comunismo de mercado a la chinesa. Aliás, a China é quem manda em muitas áreas, como infraestrutura, que precisou ser recuperada após os conflitos.
Com suas mulheres que levam pesos descomunais pelas ruas – elas carregam nas costas e na cabeça os produtos que vendem nas calçadas para sobreviver –, seu vestuário típico – que inclui belos tecidos, sedas e ornamentos como chapéus feitos de palha – e seu culto aos mortos – e possível ver pequenos cemitérios em praças públicas e lojas que vendem túmulos e lápides a cada esquina –, o Vietnã oferece um mergulho inestimável em uma cultura que ainda guarda diferenças com a ocidental. Os vietnamitas, ao contrário de japoneses e coreanos, se ocidentalizaram menos. Talvez por isso sejam mais solícitos. A cada contato, eles fazem uma saudação de paz para seu interlocutor. Sim, o Vietnã de hoje é bem diferente daquele cheio de sangue e bombas tantas vezes retratado no cinema.
Uma múmia para visitação
No centro de Hanói, uma construção quadrada, um parque amplo e grande número de soldados marcam um ponto de idolatria. Ali está em exposição a múmia de Ho Chi Min, o líder comunista que unificou o Vietnã e que dá nome à capital do país, que fica na parte sul – Hanói é a principal cidade econômica, mas não a sede política. Os turistas podem passar, assim como os habitantes locais e excursões escolares, pelo recinto dominado por uma redoma de vidro, no interior da qual está o corpo do ex-comandante. É absolutamente proibido conversar e tirar fotos dentro deste memorial. A inspiração é a cripta onde, em Moscou, repousam os restos mortais de Lênin, o líder da Revolução Bolchevique de 1917.
A culinária é boa. Experimente!
A visão de pessoas sentadas em pequenos bancos e tamboretes nas portas de casas e lojas, tomando toda a calçada e preparando o próprio alimento em fogareiros portáteis, desestimula um pouco a provar a gastronomia vietnamita. Mas não se fixe nas aparências. Tome coragem e experimente os pratos locais. Você não vai se arrepender. A pasta de arroz ou o próprio cereal servido como fazemos aqui é a base da culinária do país.
O arroz é mais papado e pode vir com menos sal, mas ele harmoniza perfeitamente com generosas porções de carne bovina e suína, especialidade de muitos restaurantes de Hanói. A apresentação pode incluir alguns charmes, como folhas de bananeira e talos de bambu, o que valoriza o gosto de molhos e condimentos. Não tema refeições apimentadas. Elas até estão nos cardápios, mas são perfeitamente evitáveis. Biscoitos feitos com massas variadas, diversos tipos de sopas e escaldados e frutas diferentes completam um menu interessante e convidativo. Bom apetite!
Perfeita descrição! Acabo de chegar de lá… só faltou a descrição da posição religiosa. Na maioria são budistas, de um budismo que lhes passa o ideal de conformismo… . Esperando-e o nirvana….