Lá em 1990, o palhaço Pennywise, com seu sorriso macabro, suas garras horrendas e seu péssimo hábito de matar os outros ficou no imaginário de muita gente e povoou os pesadelos de quem viu aquela tenebrosa história de horror do mestre do gênero, Stephen King, chegar à tela. Por isso a expectativa em torno da nova versão deste serial killer maquiado e com poderes sobrenaturais era tão grande. Tudo parecia concorrer para que tivéssemos em A Coisa mais um clássico e o público respondeu, fazendo a produção bater recordes de bilheteria e quebrar a monotonia hollywoodiana dos filmes de super-heróis. Bom, nem tudo deu certo.
O diretor do novo A Coisa, Andy Muschietti, talvez pela inexperiência – tem apenas um outro longa na carreira e se destaca mais como diretor de curtas-metragens –, errou feio na mão. Perdeu a chance de fazer um senhor filme de horror, já que tinha todos os elementos à mão, a começar pelo ator que encarna o palhaço Pennywise. O jovem Bill Skarsgard, membro de uma reconhecida família de atores, está muito bem. Imprime ao vilão toda a loucura e a impiedade que o personagem pede, mas não é capaz de salvar a produção de equívocos terríveis. Eles passam por um roteiro picotado e sem foco, uma fotografia lenta e uma direção preguiçosa, convencional, sem sustos.
E um filme de terror sem sustos já perde 50% de sua graça. São raríssimas as ocasiões em que há motivos para dar um pulo na poltrona. Quando o palhaço maluco surge, já o esperamos há alguns segundos. Por mais que sua expressão seja aterradora, ela não é o bastante para criar o clima que o gênero pede, como ocorre em outros trabalhos, vide O Chamado e sua alucinante e obcecada Samara e o clássico O Exorcista. Perto deles, a nova A Coisa vira um filme de Sessão da Tarde. Isso pode até ter um lado positivo, já que em alguns momentos a produção diverte com a aventura de seus grupo de adolescentes que resolvem encarar a assombração circense de frente.
As peripécias da garotada eclipsam o terror que Pennywise deveria imprimir antes de tudo. Em certos momentos, os mais antigos – como eu – pensarão estar vendo um remake não de uma história de horror, mas de Os Goonies, que Steven Spielberg filmou nos anos 1980 e virou emblema de uma geração com a história da garotada que enfrenta perigos desconhecidos. Lá estão o gordinho carismático, a menina de cabelo curtinho mais corajosa e esperta que os garotos, o intrépido líder de turma, o tímido, os durões que adoram fazer bullying com todo mundo. Não falta ninguém na chamada da escola. Ok, bacana, que boa nostalgia, mas onde está mesmo o terror? E A Coisa?
Cenas manjadas, confrontos forçados, poucas tomadas que nos fazem arregalar os olhos. A Coisa, infelizmente, é uma decepção. Uma continuação, chamada de Capítulo 2, está a caminho e já foi anunciada. Quem sabe se incluírem, desta vez, o próprio Stephen King no time de roteiristas, um rumo seja retomado. Pennywise é um personagem riquíssimo e que merece nos assustar mais. Nada contra a meninada e suas bicicletas, mas em um filme de terror não é possível poupar tanto os personagens. Em A Coisa apostou-se muito no carisma dos heróis e ficou difícil colocá-los como vítimas efetivas do palhaço. O resultado é um filme doce, não aterrorizante.