A paz pode abrigar-se num abraço, num carinho, na mão que dá um tapinha amigo nas costas, que acaricia a nuca de quem se gosta, que aperta a mão do outro com vontade, com vigor, com energia positiva. Aí pode estar a paz.
Mas a paz também pode habitar o vento numa praia tranquila, sob o som do marulho das ondas, da sensação da areia no pé, do sol que esquenta o corpo e reconforta a alma. A paz também pode estar aí.
Quem sabe a paz esteja no sono preguiçoso de um cachorro na grama, de um gato no sofá, de um amor no seu peito, de um contato mais estreito, mais demorado com quem se ama. É bem capaz de a paz ser assim também, não é?
Mas e se a paz se traduzir na paisagem que enche os olhos, na canção que traz recordações, na boa mesa em que se degusta o prato preferido, o sabor que acalenta, a sensação mais intensa de um prazer efêmero, mas que se pode repetir?
A paz pode ser representada nos primeiros passos titubeantes do filho, na bênção dada pelos avós, no cafuné que nos tira deste plano, que nos coloca naquele estágio intermediário entre um sonho que ainda não chegou e uma vigília que se esvai aos poucos. Quem sabe a paz não seja isso?
Há chances ainda que a paz apareça na leitura de um bom romance, na reflexão que certos versos provocam, na descoberta de uma informação desconhecida, no bom papo com os amigos em que ideias são trocadas, dadas e recebidas. Quanta paz há nisso, hein?
A paz também está no cochilo depois do almoço, na escolha do que se vai assistir no cinema, nas brincadeiras infantis em que podemos nos jogar para acompanhar a afilhada ou o sobrinho, na compra de um presente, no preenchimento de um cartão carinhoso. Como medir essa paz?
A paz pode estar no convite feito ou recebido, no descanso debaixo de uma sombra ou dentro de uma rede que balança devagar, no prazer de ser dar algum luxo, de satisfazer um desejo ancestral, na felicidade do amigo que acaba de realizar uma conquista. A paz habita esses momentos.
A paz é individual, se mostra para cada qual de uma maneira, de um jeito específico, revela-se nas pequenas coisas, nas minúcias, nos gestos mais triviais. A paz não é tangível, mas esse estado de espírito tem o poder de tanger nossa vida, nosso percurso.
A paz, esse tesouro tão cobiçado, esse anseio que parece nunca ser contemplado, pode estar nos instantes que criamos para nós mesmos, sozinhos ou junto com alguém. A paz: substantivo indefinível.
Escrevo este texto em paz, ouvindo Bethânia, Alceu, Gal, Chico, Ednardo…
Porque cantar parece com não morrer, é igual a não se esquecer que a vida é que tem razão.