Um homem que sobe ao céu impulsionado por um jato de fogo até que some das vistas de uma multidão que vibra ao som de seus acordes. Ao lado de um piano branco, vestido da maneira mais exótica possível, este homem-foguete (Rocketman), eis a representação de um dos artistas mais criativos e fora dos padrões que a segunda metade do século 20 produziu. No mundo pop, Elton John escreveu uma história singular, que agora podemos acompanhar em sua cinebiografia.
Rocketman é uma obra interessante em muitos sentidos. Poderia parecer que um novo filme sobre um astro da música britânica, poucos meses depois do sucesso de Bohemian Rhapsody, que refaz a trajetória do ídolo Freddie Mercury, seria over, mas não é o caso. O caminho trilhado pelo diretor Dexter Fletcher foi completamente diferente e a atuação do jovem ator Taron Egarton, um dos nomes em ascensão na indústria do cinema, difere daquela que deu o Oscar a Rami Malek em sua encarnação do ex-vocalista da banda Queen.
O filme que traça os altos e baixos de uma carreira meteórica de Elton John é, acima de tudo, lúdico, o que não quer dizer que seja leve. Muito pelo contrário. Entre sua infância em que é rejeitado por um pai frio e uma mãe amarga (ambos infelizes) e sua glória, há um sem número de percalços, que vão de aproximações ao suicídio ao flerte com overdoses acidentais, passando por amores interesseiros, exaustão física e mental e o consumo inveterado de álcool e cocaína. Nada é escondido ou amenizado.
Em três fases diferentes – infância, adolescente e vida adulta –, os obstáculos de Elton John não foram pequenos. Isso, porém, não leva o filme para o terreno do laudatório, como se fosse uma história de superação. Não é. O roteiro, ao contrário, guia-se muito mais pelos riscos que o astro correu de colocar tudo a perder por traumas, carência ou irresponsabilidade. Gênio criador, desde menino mostrou-se dono de um ouvido absoluto para a música e um talento nato. Mas ele precisaria enfrentar a si mesmo.
Seu início, morando de favor com uma mãe rabugenta, mas encontrando amparo em uma avó afetuosa, revela um Elton John inseguro, ingênuo, que não soube lidar bem com a fama que chegou como um tsunami após sua primeira apresentação em uma badalada boate de San Francisco. Nesses momentos-chave, o diretor foi capaz de catalisar mais que um cenário e sim a energia que circulava entre as pessoas em tais ocasiões. É quando o filme tem seus auges, com o apoio de liberdades poéticas.
Um outro aspecto interessante é como é mostrada a parceria entre Elton John e o compositor Bernie Taupin, vivido no filme por Jamie Bell. Essa dupla é responsável pelos principais sucessos da carreira do cantor. Uma relação profissional que perdura até hoje – “jamais discutimos”, orgulham-se –, mas que transborda para outros campos, sendo fundamental na recuperação do pop star de seus momentos mais difíceis. Esses, aliás, ganham destaque, mas sem perder a cor. Aliás, bota cor nisso.
Um dos pontos-fortes do filme são os figurinos, em reproduções perfeitas das roupas exóticas que Elton John sempre usou em seus shows. Uma pesquisa detalhada que contou com a ajuda do próprio cantor, que deu uma consultoria especial à produção. De acordo com o diretor, isso não impediu que episódios mais delicados fossem abordados. Um dos diálogos que ele tem com a mãe é especialmente duro. O mesmo acontece quando ele é enganado por um amante aproveitador, que é seu empresário.
Rocketman faz justiça a uma história conturbada, que há 28 anos tornou-se mais calma. Elton John precisou passar por tratamentos de desintoxicação e controle de seus muitos vícios. Ele também encontrou um amor que o deixou mais sereno. Hoje, ele e David Furnish (que também é o produtor do filme) têm uma família com dois filhos adotivos. Além disso, o cantor faz um trabalho social com portadores do vírus da AIDS mundialmente reconhecido e é um dos queridinhos da Família Real Britânica. O foguete decolou e, talvez por um milagre, não explodiu em órbita.