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Foto: Ricardo Benichio
Foto: Ricardo Benichio
Foto: Ricardo Benichio

Luís Araujo Pereira em Florações Professor e escritor | Publicado em 26 de julho de 2020

Luís Araujo Pereira
Professor e escritor
26/07/2020 em Florações

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Cinco poemas de Carlos de Assumpção

[Curadoria de Luís Araujo Pereira]

[1]

Eclipse

Olho no espelho

E não me vejo

Não sou eu

Quem lá está

 

Senhores

Onde estão os meus tambores

Onde estão meus orixás

Onde Olorum

Onde o meu modo de viver

Onde as minhas asas negras e belas

Com que costumava voar

 

Olho no espelho

E não me vejo

Não sou eu

Quem lá está

 

Senhores

Quero de volta

Os meus tambores

Quero de volta

Os meus orixás

Quero de volta

Meu Pai Olorum

Em seu esplendor sem par

Quero de volta

O meu modo de viver

Quero de volta

As minhas asas negras e belas

Com que costumava voar

 

Olho no espelho

E não me vejo

Não sou eu

Quem lá está

 

Séculos de destruição

Sobre os ombros cansados

Estou eu a carregar

Confuso sem norte sem rumo

Perdido de mim mesmo

Aqui neste lado do mar

Um dia no entanto senhores

Eu hei de me reencontrar

⁕ ⁕ ⁕

 

[2]

Protesto

Mesmo que voltem as costas

Às minhas palavras de fogo

Não pararei de gritar

Não pararei

Não pararei de gritar

 

Senhores

Eu fui enviado ao mundo

Para protestar

Mentiras ouropéis nada

Nada me fará calar

 

Senhores

Atrás do muro da noite

Sem que ninguém o perceba

Muitos dos meus ancestrais

Já mortos há muito tempo

Reúnem-se em minha casa

E nos pomos a conversar

Sobre coisas amargas

Sobre grilhões e correntes

Que no passado eram visíveis

Sobre grilhões e correntes

Que no presente são invisíveis

Invisíveis mas existentes

Nos braços no pensamento

Nos passos nos sonhos na vida

De cada um dos que vivem

Juntos comigo enjeitados da pátria

 

Senhores

O sangue dos meus avós

Que corre nas minhas veias

São gritos de rebeldia

 

Um dia talvez alguém perguntará

Comovido ante meu sofrimento

Quem é que está gritando

Quem é que lamenta assim

Quem é

 

E eu responderei

Sou seu irmão

Irmão tu me desconheces

Sou eu aquele que se tornara

Vítima dos homens

Sou eu aquele que sendo homem

Foi vendido pelos homens

Em leilões em praça pública

Que foi vendido ou trocado

Como instrumento qualquer

Sou eu aquele que plantara

Os canaviais e cafezais

E os regou com suor e sangue

Aquele que sustentou

Sobre os ombros negros e fortes

O progresso do país

O que sofrera mil torturas

O que chorara inutilmente

O que dera tudo o que tinha

E hoje em dia não tem nada

Mas hoje grito não é

Pelo que já se passou

Que se passou é passado

Meu coração já perdoou

Hoje grito meu irmão

É porque depois de tudo

A justiça não chegou

 

Sou eu quem grita sou eu

O enganado no passado

Preterido no presente

Sou eu quem grita sou eu

Sou eu meu irmão aquele

Que viveu na prisão

Que trabalhou na prisão

Que sofreu na prisão

Para que fosse construído

O alicerce da nação

O alicerce da nação

Tem as pedras dos meus braços

Tem a cal das minhas lágrimas

Por isso a nação é triste

É muito grande mas triste

E entre tanta gente triste

Irmão sou eu o mais triste

 

A minha história é contada

Com tintas de amargura

 

Um dia sob ovações e rosas de alegria

Jogaram-me de repente

Da prisão em que me achava

Para uma prisão mais ampla

Foi um cavalo de Troia

A liberdade que me deram

Havia serpentes futuras

Sob o manto do entusiasmo

Um dia jogaram-me de repente

Como bagaços de cana

Como palhas de café

Como coisa imprestável

Que não servia mais pra nada

Um dia jogaram-me de repente

Nas sarjetas da rua do desamparo

Sob ovações e rosas de alegria

 

Sempre sonhara com a liberdade

Mas a liberdade que me deram

Foi mais ilusão que liberdade

 

Irmão sou eu quem grita

Eu tenho fortes razões

Irmão sou eu quem grita

Tenho mais necessidade

De gritar que de respirar

 

Mas irmão fica sabendo

Piedade não é o que eu quero

Piedade não me interessa

Os fracos pedem piedade

Eu quero coisa melhor

Eu não quero mais viver

No porão da sociedade

Não quero ser marginal

Quero entrar em toda parte

Quero ser bem recebido

Basta de humilhações

Minh’alma já está cansada

Eu quero o sol que é de todos

Quero a vida que é de todos

Ou alcanço tudo o que eu quero

Ou gritarei a noite inteira

Como gritam os vulcões

Como gritam os vendavais

Como grita o mar

E nem a morte terá força

Para me fazer calar

Protesto (1982)

⁕ ⁕ ⁕

 

[3]

Prece

Castro Alves que estais no céu

santificado também seja o vosso nome

Olhai por nós agora e sempre do além

Estendei as mãos sobre a cidade

Acendei a chama da liberdade

do amor da fraternidade

como vossos versos ensinado têm

Rumo às alturas às estrelas

guiai nossos passos Castro Alves

agora e sempre por todo sempre

Amém

⁕ ⁕ ⁕

 

[4]

Rotina

Vai um homem negro sozinho

na noite caminhando devagar

 

Devagar caminhando na noite

sozinho um homem negro vai

Cuidado irmão o perigo

traspassa a noite como punhal

Irmão cuidado eis que na esquina

na noite deserta surgem quatro policiais

 

É tarde é muito tarde a noite

se fecha com mãos de ferro é tarde demais

A noite se fecha cercando o homem negro

se fecha com mãos de ferro como tenaz

Com as mãos vermelhas eis que apressados

desaparecem na noite os policiais

Olhos apagados imóvel no chão pedra fria

em poça vermelha meu irmão jaz

E não vai mais abrir os olhos nem levantar-se

nem caminhar de noite nem dia nunca mais

Quilombo (2000)

⁕ ⁕ ⁕

 

[5]

Encontro

De repente a noite em horas mortas

Abre a porta do meu quarto

E entra silenciosamente

Em passos suaves de sombra

Despe do corpo de veludo o tênue véu

E nua deita-se em minha cama macia e quente

Bailam no ar risos arrulhos e acres odores

De repente o quarto faz-se céu

Engalana-se de estrelas esplendentes

Astros inspiradores de quem ama

Tambores da noite (2009)

Perfil

Carlos de Assumpção nasceu em Tietê-SP no dia 23 de maio de 1927 e vive atualmente em Franca, para onde transferiu residência em 1969. Foi educado em uma família que tinha a militância política como virtude. Nessa cidade, após os 40 anos, formou-se em Letras e Direito, graduações estas que possibilitaram a sua atuação no magistério e na advocacia. Como poeta tornou-se conhecido com a divulgação de seu poema “Protesto”, sendo homenageado em diversas ocasiões. Publicou cinco livros, que se tornaram edições raras: Protesto (1982), Quilombo (2000), Tambores da noite (2009), Protesto e outros poemas (2015) e Poemas escolhidos (2017). Ao lado desses títulos,  pode ser incluído agora Não pararei de gritar (Companhia das Letras, 2020). Com organização e posfácio de Alberto Pucheu, o livro reúne todos os seus poemas e inclui inéditos. A certa altura do seu ensaio, Pucheu faz as seguintes considerações: “Ao sinalizar uma de nossas falas fundadoras e revelar a exclusão como estratégia de domínio colonizador – com consequências drásticas em nosso tempo –, a poesia de Carlos de Assumpção se apresenta como uma fundação tardia do Brasil. Ela é uma aposta ética e política num outro passado e num outro presente, no qual os negros finalmente teriam visibilidade afirmativa. Atrever-se a falar, a pensar e a criar como faz este poeta é reverter a história escravocrata na qual, como um modo extremamente eficaz de dominação colonial, o silêncio dos oprimidos foi naturalizado e a manifestação dos negros impedida por meio da violência tanto física como simbólica. É aqui que Carlos de Assumpção assume como poucos o papel de ocupação do discurso, expondo os conflitos paradoxais formadores dos negros no Brasil, com o objetivo  de participar da luta por um futuro mais justo.” A respeito de aspectos formais de sua linguagem poética, chama “a atenção ainda para os poemas com ressonâncias temáticas e sonoras afro-brasileiras e para os poemas seriais, com tambores, berimbaus, batuques. Em assonâncias, aliterações, repetições e síncopes, com modulações de timbres e tonalidades orais, ecoando no português efeitos linguístico-musicais populares e africanos, eles ritmam o grito dos que estão ‘cansados de tanta dor’”.

 

Tag's: Alberto Pucheu, Carlos de Assumpção, Cia das Letras, Não pararei de gritar, negritude, poesia, poesia afro-brasileira, poesia brasileira

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4 comentários em “Cinco poemas de Carlos de Assumpção”

  1. ELIANA FERREIRA DE CASTELA disse:
    15 de maio de 2021 às 21:01

    Grande contribuição Carlos Assunção deixa para a sociedade.

    Responder
  2. Hagar Araújo Corrêa dos Santos disse:
    16 de maio de 2021 às 15:12

    Amei esse autor!são belas reflexões através dos poemas

    Responder
  3. Hagar Araújo Corrêa dos Santos disse:
    16 de maio de 2021 às 15:13

    Belas reflexões através dos poemas

    Responder
  4. Neuza Alves disse:
    23 de outubro de 2021 às 10:59

    Fico a me perguntar quais motivos levam à falta de ampla divulgação nacional a respeito da vida e obra desse poeta!!! Uma maturidade intelectual ímpar, mesclada com fortes sentimentos de irresignacão, dor, sofrimento, herança da ancestralidade vivida, experimentada, absorvida! Vida longa a Carlos Assunção!!!

    Responder

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