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Imagem: cena de O Céu que nos Protege (Bernardo Bertolucci, 1990)
Imagem: cena de O Céu que nos Protege (Bernardo Bertolucci, 1990)
Imagem: cena de O Céu que nos Protege (Bernardo Bertolucci, 1990)

Rosângela Chaves em Veredas Jornalista e professora | Publicado em 6 de outubro de 2020

Rosângela Chaves
Jornalista e professora
06/10/2020 em Veredas

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Deserto interior

Poucos cenários sobre a face da Terra exprimem com tanta veemência a impotência do ser humano diante das forças da Natureza como o deserto. Hostil, muitas vezes traiçoeira, a paisagem desértica se erige como um desafio à racionalidade ocidental no seu esforço de domesticação do mundo, em sua tarefa – que tem cada vez mais se revelado desastrosa – de converter o planeta à sua imagem e semelhança. É justamente o deserto, em sua agressiva majestade, como se fosse uma entidade dotada de vontade própria, o ambiente em que se desenvolve a trama de uma obra fundamental da literatura norte-americana do século XX: O Céu que nos Protege, de Paul Bowles (1910-1999).

Os protagonistas do romance, Kit e Port, formam um rico casal norte-americano em crise que decide se aventurar pela região do deserto do Saara, logo após a Segunda Guerra Mundial, em companhia de um amigo, Tunner. Mais do que fugir do tédio e da monotonia de uma relação de dez anos, eles parecem tentar, sobretudo, escapar de si mesmos. Porém, onde quer que estejam durante seu périplo pelas paisagens exóticas do continente africano e em meio a culturas que não conseguem compreender, ambos se deparam apenas com seus próprios espectros – como se o mundo tivesse se transformado em um daqueles labirintos de espelhos que somente refletem a imagem deformada de quem passa.

Logo no início do romance, Port e Kit se definem como viajantes, não como turistas. Conforme a concepção de Port, turista é aquele que nunca questiona a sua própria civilização. Não importa onde vá e o tempo de sua jornada, o turista é sempre um visitante distraído e superficial, que percorre os mais diferentes lugares como se estivesse folheando sem muita atenção uma revista, incapaz de se abrir para o outro, para o diferente.

Exemplo típico dessa “espécie” no livro é a bizarra dupla formada por uma escritora inglesa de roteiros de viagem e um homem muito mais jovem que se apresenta como seu filho. Apesar de estar viajando há anos pelo Saara, eles não perdem uma chance de demonstrar o seu desprezo pelos povos da região, proclamando o tempo todo a suposta superioridade da cultura branca e ocidental.

Em contrapartida, o viajante, conforme descreve Port, é quem continuamente confronta o seu país com os outros locais que vai conhecendo e não hesita em rejeitar aqueles elementos de sua terra natal que ele julga que saem perdendo neste exercício de comparação. No seu caso, o que Port repelia com mais vigor de sua própria cultura era o mundo mecanizado do capitalismo, no qual indivíduos diletantes como ele próprio não têm nenhum lugar.

Mas se Port recusa a suas origens, sentindo-se um estrangeiro em seu próprio mundo, essa atitude não significa necessariamente que ele esteja aberto para a alteridade, já que tampouco consegue enxergar além de si mesmo.  Permanece fechado para os outros – seja Kit, sua mulher; seja Tunner, cuja presença cada vez mais vai tornar-se incômoda para ele; seja os nativos, com os quais mantém uma relação ambígua, às vezes tentando aproximar-se deles, em outras tratando-os de uma maneira orgulhosa e até mesmo cínica.

Essa incapacidade de se comunicar, aliás, não é só um traço de caráter de Port, mas converte-se no grande tema do romance. Todos os personagens parecem estar representando um papel, temerosos de expor seus sentimentos e cobrindo-se de uma couraça de dissimulação e hipocrisia que só faz os afastar ainda mais entre si. Kit e Port só conseguirão por um momento fugaz transpor essa barreira de incomunicabilidade quando uma tragédia desabar sobre o casal – tragédia que vai conduzir Kit, uma mulher até então sexualmente reprimida, a uma jornada sensual e sensorial pelos lugares mais remotos do Saara.

Interpondo-se entre esses personagens conflituosos, a imensidão do deserto só acentua a solidão e o desespero em que eles se veem submersos. À medida que a narrativa se desenrola e a catástrofe que se prenuncia torna-se mais evidente, também o cenário desértico fica mais intensamente árido e ameaçador. No desenlace desse romance magnífico – que recebeu uma adaptação à altura para o cinema em 1990 por Bernardo Bertolucci, com Debra Winger e John Malkovich como protagonistas – por fim vemos concretizado o temor que Port expressa, durante um diálogo com Kit: o de que por trás do azul do céu, que nos ilude com a sensação de conforto e proteção, só exista o horror de uma profunda escuridão, que inexoravelmente um dia nos alcançará.

Tag's: literatura, literatura norte-americana, O Céu que nos Protege, Paul Bowles

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