Minha mãe, depois do almoço, punha-se a lavar os pratos, as panelas, os copos e os talheres. Ela lavava todos esses objetos como se cada um deles fosse uma obra de arte. Todos eles, depois de lavados, ficavam excessivamente limpos, reluzentes, exalando um cheiro agradável de sabão, como se nunca tivessem sido usados, como se acabassem de sair da fábrica. Eles eram colocados em cima de um estrado, lá no quintal, para escorrer a água, ao mesmo tempo em que o sol os secaria. Assim dispostos – os de louça junto com os de louça, os de vidro junto com os de vidro, os de alumínio junto com os de alumínio –, eles formavam um conjunto variado e bem-arranjado, como se estivessem numa exposição, à espera do público. O rosto de minha mãe refletia-se nos vasilhames de alumínio na hora em que ela se abaixava para colocar um copo ou uma travessa na parte de baixo do estrado. De perto, eu a observava, com admiração, considerando-a a melhor mãe do mundo. A minha mãe. Tão querida como uma mãe pode ser.
Eu nunca vi a minha mãe reclamar do seu trabalho, antes ou depois do almoço. Eu nunca ouvi a minha mãe dizer que a sua vida era dura, insuportável ou além de suas forças. Para minha mãe, os trabalhos domésticos eram uma coisa natural, como se ela tivesse herdado da minha avó um número determinado de tarefas que seriam repetidas ao longo da vida. Como se o fato de ser mãe significasse lavar pratos, panelas, copos e talheres, todos os dias, depois do almoço e da janta. Como se ela não tivesse direito a queixas. Como se a sua servidão a casa fosse o único sentido de sua vida. Preparando o café da manhã, o almoço ou a janta, lavando e engomando as nossas roupas, a minha mãe desempenhava o papel de uma escrava da família.
A vida da minha mãe consistia, pois, em desenvolver, todos os dias, um número regular de tarefas. Para o marido, os filhos, as coisas específicas da casa. Depois que ela colocava os pratos, as panelas, os copos e os talheres para secar no quintal, à luz do sol, passava para outra etapa de suas atividades domésticas. Igual ao dia anterior, pegava uma vassoura e varria a casa. A sala. Os quartos. A cozinha. Porque o quintal, segundo uma disciplina imutável, só seria varrido no final da tarde. Ela começava sempre pela manhã, bem cedinho, e, em seguida, percorria os demais cômodos, obedecendo à sua ordem de distribuição dentro da residência. Primeiro a sala, depois os quartos e banheiro; a cozinha ficava sempre por último. À medida que ela ia passando por esses espaços, as cadeiras voltavam a esconder as suas pernas debaixo das mesas, os lençóis esticavam-se sem nenhuma dobra, adaptando-se aos contornos do colchão, a poeira decolava dos móveis, um jarro, quando flores havia, era remexido e rearranjado, mesmo que isso não fosse absolutamente necessário. Parecendo uma bailarina, a minha mãe deslizava por todos esses espaços, incansável e alegre, porque a sua arte resumia-se a esse palco.
Cada lugar e cada objeto organizavam-se à sua passagem, ficando atrás de si a impressão de um mundo perfeito e recém-inaugurado. A sala, os quartos, a cozinha, nas mãos de minha mãe, pareciam com os pratos, as panelas, os copos e os talheres nas mãos de minha mãe: a diferença era apenas de dimensão e substância porque ela, infatigável, igualava todas essas coisas com a sua habilidade. Nas mãos de minha mãe, a nossa casa renascia todos os dias.
Eu gostava de ver a minha mãe movendo-se pela casa. Era uma pessoa que vivia absorvida e entregue a um número infindável de ocupações. Onde se esgotava uma surgia outra, e assim por diante, como se cada tarefa se prolongasse na seguinte. Feminino, familiar, mãe – eu ainda reconheceria esses signos, tão diferentes mas tão contíguos.
Depois de lavados os aparelhos do almoço e varridos os espaços da casa, ela começava a se ocupar de outra coisa. Como acontecia duas vezes por semana, reunia a roupa suja e a levava para o tanque. Depois, como era também o seu hábito, quando lavava roupa, preparava o tacho para fazer doce de mamão. Sempre que era possível, como nesse caso, fazia duas coisas ao mesmo tempo. Ela corria às vezes do tanque ao fogão se pressentisse, por exemplo, que o seu doce estava prestes a se queimar ou que ele estava quase no ponto. Aí, examinava e provava o preparo, as achas de lenha crepitando debaixo do tacho. O fogo, intenso, era abrandado para se evitar o pior, quando retirava uma das achas ou espalhava as brasas. Uma vez realizada essa operação, a minha mãe abandonava o fogão e voltava ao tanque. O doce de mamão, nesse momento, invariavelmente, estava pronto, à espera de que, uma vez frio, fosse guardado em bojudas compoteiras de vidro.
O trabalho de lavagem de roupa se resumia a esfregar e bater cada peça, transferindo as roupas lavadas do tanque para a bacia, e vice-versa – como se fosse necessário mais uma vez esfregar e bater as roupas que tinham ficado de molho dentro da bacia. Era um trabalho pesado, cansativo, que deixava a minha mãe com o rosto vermelho por causa do esforço.
Uma vez lavadas as roupas, estas eram estendidas no varal, uma por uma. As calças, as camisas, as meias, as blusas, os vestidos, as cuecas, as fronhas, as calcinhas, as toalhas, os forros e os lençóis pareciam com os pratos, os talheres, os copos e as panelas nas mãos de minha mãe: ela lavava toda a roupa como se cada peça fosse também uma obra de arte. Elas ficavam excessivamente brancas, admiravelmente bem lavadas, exalando um aroma de limpeza, ternura e frescor. Além disso, desses serviços que exigiam várias horas, ela passava ainda a ferro a brasa e costurava as nossas roupas nos dias em que não lavava nem se ocupava com outra longa tarefa. A minha mãe sabia fazer muitas coisas – e o seu talento multiplicava-se dentro da casa todos os dias.
Depois da janta, repetia a tarefa realizada depois do almoço. Os aparelhos usados no jantar, que eram ordinariamente os mesmos utilizados precedentemente, eram lavados, um por um, copo por copo, colher por colher, prato por prato, panela por panela, até que o último fosse depositado, no maior esmero, em cima do estrado para escorrer a água. Como não havia sol, secariam por si mesmos, lá fora, ao relento. Eles ficariam no quintal até a hora de dormirmos, quando seriam então recolhidos, um por um, até que o último fosse depositado na prateleira da cozinha.
Depois da janta, na sala, a minha mãe gostava de ligar o rádio, todas as noites. Era nessa hora que ela parecia descansar dos trabalhos domésticos realizados durante o dia. Ouvindo as músicas de sucesso. As notícias. Os programas de auditório. Se chegasse de repente uma visita, o volume do rádio seria diminuído ou desligado ou, ainda, conforme o interesse da transmissão, a pessoa que havia acabado de chegar se integraria às presentes e passaria também a ouvir o rádio.
Depois da janta é que minha mãe podia conviver com a sua família porque, nesse momento, todos estavam em casa. Sob o seu comando, a nossa casa oferecia nesse intervalo a sua limpeza e a sua hospitalidade, ao lado dos filhos e do marido. Predominavam aí as conversações, o discurso monocórdico de minha mãe, a transmissão múltipla do rádio. Às vezes, eu cochilava. Meu pai, como sempre, por causa de sua timidez, ficava quieto em sua cadeira, os braços cruzados, esperando a sua vez de falar, quando falava.
A minha mãe comentava com o meu pai, ou com as visitas, as suas atividades e os acontecimentos do dia: um crime na feira, o preço dos alimentos, um desastre, as doenças de parentes ou amigos, a escola dos filhos ou qualquer outro assunto que merecesse a sua apreciação. À noite, depois da janta, a família era avaliada, a sua organização, os seus problemas, as questões relativas a dinheiro – todo repertório do dia vivido, e do próximo a ser vivido, passava enfim por uma espécie de exame. Minha mãe, a sábia, dava o veredicto final: “Hoje, tivemos um bom dia. Vamos ver como vai ser o de amanhã.”
As notícias do rádio eram, pois, entrelaçadas à conversa das visitas, às raras ponderações do meu pai, às observações da minha mãe. Solene ou humorada, a minha mãe falava segundo a sua compreensão do mundo – a sua eloquência era, na verdade, sobre os filhos, o marido, a casa, as outras coisas fora desses limites, mas que, por uma razão ou outra, relacionavam-se com a sua família.
Depois da janta, o rádio aproximava o mundo. Ele se introduzia em nossa casa como um intruso que nos projetava para fora dela, em busca de outros universos menos circunscritos. Minha mãe falava. Meu pai falava, mesmo pouco. As visitas falavam. O rádio falava. E, nessa sucessão e alternância, a noite consumia-se por meio das vozes. A fala de minha mãe era sempre sobre a sua família e o mundo trazido de longe pelo rádio. Eu, no meu canto, procurava compreender esses significados aparentemente banais.
Depois da janta, quando todo mundo já tinha ouvido as músicas e as notícias, as visitas já tinham ido embora, quando os pratos, as panelas, os copos e os talheres tinham já sido recolhidos, e toda a casa estava trancada, as tramelas no devido lugar, chegava o momento em que íamos dormir. O bairro, com as suas casas assim imersas no silêncio, dava a impressão de uma cidade-fantasma, porém respirando e pulsando por intermédio de milhares de pessoas anônimas e cansadas, cujo repouso eliminava apenas temporariamente o robô que habitava em cada uma delas.
Antes de dormir, a minha mãe perguntava aos filhos se tínhamos rezado. Ela nos abençoava. A sua última palavra era ainda para os filhos e a família, pedindo a Deus uma graça mínima. Eu dormia, sonhava, o mundo era um assombro por causa do silêncio, a noite dos pobres era melhor do que o dia.
De manhã, bem cedo, eu acordava com o barulho das xícaras, dos talheres, das panelas, da porta do armário rangendo, com os miados do gato, o ruído de água escorrendo – os barulhos familiares, portanto. Era a minha mãe que já tinha se levantado e agitava a cozinha, preparando o café. Um cheiro gostoso e inebriante invadia a casa nesse momento. Ela recomeçava o seu trabalho bem cedinho, antes de todos se levantarem, antecipando-se inclusive ao meu pai. A minha mãe, a que acordava com o canto dos galos. A madrugada, ao contrário da canção, pertence às mulheres.
Depois de um dia, para minha mãe, só havia outro dia, carregado de repetições: como filha mais moça, eu devia aprender essa dura lição, mas difícil apenas para quem não aceita com subserviência a ordem das coisas, a ordem miserável das coisas, a ordem miserável das coisas.