Ele falou no momento em que a mulher abriu a porta, sem parecer invasivo ou inconveniente:
“Desculpe-me incomodá-la, senhora, mas sou o velho Toledo, o melhor amigo do seu marido. Se ele falou porventura de mim alguma vez, deve ter-lhe dito que nunca deixei um irmão em apuros.”
Com gestos nervosos, às vezes descontrolados, a mulher esfregou as mãos e assentiu, aflita:
“Me desculpe, entre por favor, estou esperando o senhor há tanto tempo…”
“Qual perdão mereço, senhora? – Me atrasei no caminho.”
A sala na qual entrou tinha aroma de flores esmagadas. Embora houvesse bastante espaço, as poltronas e um enorme sofá pareciam fora de lugar. Depois de avaliar o ambiente, voltou a sua atenção à mulher e perguntou:
“Onde estão as crianças?”
Ela respondeu, com um tremor nos lábios, que estavam na casa dos avós.
A tarde já começava a entrar na manhã. A sala onde estavam era iluminada pela luz que se projetava sobre os móveis, vinda de uma das grandes janelas.
A mulher indagou, disfarçando a sua angústia:
“O senhor não quer se sentar?”
O homem alcançou a poltrona mais próxima e ajeitou-se no móvel, como se estivesse cansado. A poltrona bufou discretamente. Depois disso, houve um silêncio difícil, quase intransponível – um silêncio que os desorientava momentaneamente.
Ela fechou a porta da sala, sentou-se diante dele e fez o comentário que a incomodava:
“O meu marido disse que nós podíamos contar com o senhor, para o bem e para o mal. Ele esperou um mês, o pior mês de sua vida, pois ansiava todos os dias receber uma ligação, que nunca veio…”
Ele explicou mais uma vez, com paciência:
“Como disse há pouco, eu me atrasei no caminho. A senhora deve me perdoar. Mas não vou deixar de modo algum o assassino do meu amigo comer uma leitoa no próximo Natal.”
Após ouvir essa promessa, a mulher perguntou se ele aceitava um cafezinho. O homem respondeu que, depois da bebida, naquela tarde mesma, gostaria de resolver a parada, pois tinha que seguir adiante – muito adiante.
E disse por fim que era um homem que andava pelas estradas, tropeçando aqui e ali. “Mas nunca deixei de chegar aonde queria e principalmente de atingir os meus objetivos” – enfatizou.
No momento em que a mulher se levantou para ir à cozinha colocar a água pra ferver, disse, com sentimentos confusos, que ainda a machucavam:
“Eu gostaria de mostrar a casa, o quarto das crianças e o retrato em que o senhor aparece ao lado do meu marido” – e, nesse momento, começou a derramar lágrimas –, “mas sei que a sua tarde não vai ser fácil, e o seu tempo é precioso…”
Depois, deu-lhe as costas e foi à cozinha providenciar a rubiácea.