O menino estava ao lado do pai diante de um edifício público. Debaixo do sol das onze horas, permaneciam ali confiantes, esperando o desfile de Sete de Setembro. O garoto não se incomodava com o calor porque as atrações que aguardava prometiam momentos divertidos: os pelotões dos estudantes, as bandas e fanfarras estrondosas, os militares com os seus uniformes esbeltos e os carros alegóricos.
Os dois estavam em pé sobre a calçada em uma avenida larga e contidos por uma corda que impedia a passagem para o outro lado. Era quase engraçado ver o menino tentando se desvencilhar da corda em seu pescoço. Sem perceber o confinamento e, menos ainda, o controle que submetia todos a um feriado de falsas civilidades, o alto-falante espalhando frases ufanistas, ele observava as pessoas que se amontoavam do outro lado da calçada, muitas crianças sentadas no meio-fio.
Enquanto olhava nas duas direções, movendo nervosamente a cabecinha, como se evitasse perder o lado no qual apareceria o desfile, sem tê-la percebido antes, viu de repente a bandeira.
Estava no alto de um mastro, balançando ao vento, completamente esfarrapada, com pontas irregulares – apenas um pobre pano raquítico, que não protegeria um cachorrinho do frio. Todo o seu quadrilátero, por causa da ação das intempéries ao longo do tempo, as quatro cores desbotadas, sem o fulgor do que cada uma representa – tudo isso o comoveu. O moleque, lembrando a lição que aprendera na escola, sofreu um baque, pois sabia alguma coisa sobre a simbologia das cores.
Era a bandeira da pátria a que ele viu – o nosso lábaro positivista.
Surpreendido pela visão, apontou com insistência a direção na qual o arruinado estandarte tremia, mas foi ignorado pelo pai. Ela estava lá, no alto do prédio oposto, sofrendo a doença das bandeiras. Insatisfeito, o menino puxou a sua calça, levantou o braço e indicou-a com o dedo.
“Sim, filho, eu já tinha visto”, mentiu, aprumando-se depois de ouvi-lo.
Em seguida, voltou à sua concentração visual que estava no outro lado da calçada: uma mulher vistosa, sorridente, com uma bolsa presa ao ombro. Ela conversava descontraída com uma colega e, de vez em quando, o vento, abusador, levantava a sua roupa numa altura indiscreta. O homem não perdia um tremular de sua saia, esperando que o vento, em outra investida altaneira, soerguesse-a mais ainda para revelar de novo um par de coxas perturbadoras, embora isso fosse um detalhe fugaz, porque, quando o vento era demasiado atrevido, ela rapidamente abaixava as mãos protegendo o seu recato.
As mãos que detinham a invasão do vento deixavam sem dúvida o homem contrariado, como se o sacana pensasse:
“Na melhor da cena, a porra da luz acaba.”
Inconformado, o pirralho insistiu de novo, puxando mais uma vez a calça do pai. Num movimento irritadiço, o homem abandonou o flerte com a mulher – que agora lhe sorria descaradamente – e abaixou de novo a cabeça, como se fizesse outra vez o favor de ouvir o filho.
“Pai, olha a bandeira”, insistiu o filho, na ansiedade de não ter sido compreendido anteriormente.
Como segunda condescendência naquela manhã, o homem acariciou outra vez a sua cabeça e voltou à posição em que se encontrava, de olho fixo na mulher. À sua frente, a poucos metros, havia uma promessa que o desnorteava, tingindo a sua libido de esperança.
Naquele momento, tinha outro símbolo com que se entreter e vislumbrar, pois a barra da saia da moça continuava a ser levantada com as investidas do vento, como se o tecido, leve, vaporoso, fosse outra bandeira desfraldada a evocar países baixos e úmidos, sob o abrigo de uma lingerie cujo detalhe – que viu num relance – sugeria fantasias bem safadinhas.