Da Cidade do México – O México é muito conhecido por suas novelas, certo? Sim, claro, mas não pelos motivos que você pode pensar de imediato. É evidente que os dramalhões produzidos industrialmente pela Televisa e passados e repassados na programação vespertina e noturna do SBT ajudam a estereotipar a cultura do país, mas estamos falando aqui de outro tipo de novela, aquela impressa em livros e que tem influenciado gerações e mais gerações de autores e leitores. O México, afinal, é a terra de Juan Rulfo, autor da – vejam vocês – novela clássica Pedro Páramo, que redimensionou a literatura latino-americana a partir da segunda metade do século 20.
Uma nação que tem um bastião literário como esse e, de quebra, ostenta um Nobel de Literatura, dado ao ensaísta Octavio Paz em 1990, não pode relegar suas livrarias ao ostracismo. E não relega mesmo, muito pelo contrário. A Cidade do México é um paraíso para quem gosta de ler e garimpar obras antigas e esgotadas ou edições novinhas em folha, a preços salgados ou de liquidação. Por suas ruas antiquíssimas, no entorno da velha catedral erguida sobre templos astecas, verdadeiras minas de ouro literárias se mostram discretamente em lojas de aspecto velho, em portas sem cor, com um leve cheiro de guardado exalando, convidativo. Bem-vindos à Rua Donceles.
No coração da metrópole, essa rua cheia de sebos impressiona. Próxima aos principais museus da capital e a apenas dois quarteirões da Praça da Constituição, a Donceles começa a mostrar suas riquezas a partir do cruzamento com a Rua República do… Brasil! Isso mesmo. São cerca de cinco quadras onde se concentram quase 20 lojas de livros antigos, que parecem pequenas na entrada, mas que são formadas por imensos corredores, apinhados de prateleiras com quase três metros de altura. É livro para todo lado.
Como bem cabe a um sebo que se preze, reina uma certa desorganização. Isso, porém, não impede que os curiosos se refestelem com edições e coleções para todos os gostos. História, política, ficção, quadrinhos, infanto-juvenis, em brochura ou ricamente encadernados, e com preços bem em conta. O comprador não pode se queixar dos acervos. Todas as lojas reservam espaço especial para os autores da terra. Carlos Fuentes e o próprio Octavio Paz são as vedetes, mas também há muitos livros de outros escritores mexicanos, como Xavier Velasco e Carlos Monsiváis.
As mulheres, entretanto, lideram a procura, sobretudo as obras de Elena Poniatowska (nascida na França, mas com carreira no México), Rosario Castellanos e Laura Esquivel (autora do best-seller adaptado para o cinema Como Água Para Chocolate). Os selos mexicanos disponibilizam edições de todos os formatos desses livros. Com mais paciência, é possível encontrar, a preços um pouco mais altos, tiragens antigas do contista Juan José Arreola, de Mariano Azuela – que bem representa a transição da literatura mexicana do século 19 para o 20 – e o poeta Alfonso Reyes Ochoa.
Uma rua cheia de sebos não é a única atração literária da Cidade do México. Não muito longe dali, na conexão entre duas das principais estações do metrô da capital mexicana, esconde-se algo que não se vê em qualquer lugar. A estação Zócalo fica no coração das principais atrações turísticas do centro antigo da metrópole, como a imponente Catedral Metropolitana, as ruínas do Templo Mayor (antigo polo do poder asteca na região) e o Palácio Nacional. Descendo suas escadas, há um grande corredor subterrâneo que leva à estação Pino Suárez, a oito quadras dali.
Esse corredor serpenteia por mais de um quilômetro e em todo ele (todo ele!) há livrarias. São nada menos que 40 lojas de livros, de cunho geral ou especializadas. Estabelecimentos com edições de Direito, Medicina, Psicologia, Artes dividem essa verdadeira passarela literária com outros que oferecem edições econômicas e luxuosas de clássicos da literatura universal. Grandes selos como Paidós, Alfaguara e Penguin Random House têm representações nesse conjunto dedicado aos livros. A circulação de pessoas por ali é intensa.
Uma característica interessante dos 226 km de metrô da Cidade do México é que nele encontramos todos os públicos. Com congestionamentos que podem levar o motorista a gastar três horas para andar 20 km, a metrópole de mais de 20 milhões de habitantes vive entupida e um transporte público com vasta cobertura como o metrô (são 12 linhas diante das 4 do Rio de Janeiro, por exemplo), mesmo cheio até as tampas – e onde na megalópole isso não acontece? –, torna-se uma alternativa e tanto, ainda mais se o usuário puder escolher os horários de nele andar. Com isso, as livrarias do corredor literário se aproveitam de um trânsito quase ininterrupto de estudantes e pessoas com maior poder aquisitivo que pegam o metrô diariamente.
No México, os escritores têm enorme prestígio e isso se vê não só no grande número de livrarias. Grafites em muros e viadutos e estátuas em parques homenageiam os maiores nomes de sua literatura. Assim, o país segue uma espécie de tradição das nações latino-americanas. Buenos Aires, terra de Borges e Cortázar, tem mais livrarias que todo o Brasil. Alguns dos principais pontos turísticos do Uruguai são livrarias. No Chile, alguns dos museus mais visitados têm relação com literatos. No Peru, há uma livraria atrás da outra. O Brasil, onde nasceram autores do tamanho de Guimarães Rosa, Cecilia Meireles e Carlos Drummond de Andrade, bem que poderia valorizar um pouco mais uma área que é vista com tanto carinho em nossos vizinhos.
Senhore, desde Brasiul (São Pauo) estoy buscando livros de scultismo. Puedem me ajidarme?
Graci