Naquela noite, Castillo estava num cassino chamado Dos Corsarios, que ocupava uma grande área no final de um caminho ornamentado de palmeiras. Àquela hora, elas se dobravam de modo preguiçoso à passagem do vento que soprava velozmente, vindo do golfo. Era uma noite graciosa em todo o Panamá, o istmo que une duas Américas.
As pessoas que estavam no recinto sentiam-se felizes e recompensadas, pois logo mais iriam assistir a uma apresentação de Bola de Nieve, o grande cantor de Cuba.
Acompanhado do seu copo de uísque, gozando o frescor da noite e admirando o ambiente com suas mesas de jogo e pessoas sorridentes, entre aromas de charutos, Castillo dizia para si mesmo com excessiva autoconfiança:
“Se a vida é um vazio, ainda bem que temos a bebida para preenchê-lo.”
E riu sozinho com o seu bom humor, porque estava alegre, ansioso pelo show – e esperava Maite, a mulher linda e inteligente de Havana.
Aos poucos, as mesas começaram a ser ocupadas. Era uma noite de casais elegantes que vinham dos bairros mais nobres. A orla, com a sua fileira de luzes brilhantes, acalentava naquele momento os prazeres que só a noite panamenha pode oferecer.
Por causa dos seus encantos naturais e de sua riqueza histórica, Castillo escolhera o Panamá como o país de seu exílio voluntário. Não só por isso, mas também porque estava próximo de sua ilha e de seus camaradas. Depois dos anos difíceis, ele decidira recomeçar a sua vida com Maite em outro país.
O gelo estalando no copo à sua frente, feliz e cheio de esperança, pensou mais uma vez em sua mulher e, agora impaciente, consultou o relógio.
Quando um foco de luz acendeu de repente sobre o piano no palco, que ficava em plano elevado, o mestre de cerimônias anunciou:
“Ahora, señoras y señores, con ustedes, Bola de Nieve!”
Logo depois, sob ovações, um deus negro sentou-se ao piano enquanto as palmas ficaram mais vibrantes. O corpanzil rivalizando com o instrumento, os dedos ágeis, sem economizar gestos performáticos, o cantor iniciou o seu programa com um dedilhado, após o qual exibiu o seu virtuosismo. Em seguida, começou a cantar a canção favorita de Castillo:
“Adiós, felicidad, casi no te conocí,/ pasaste indiferente/ sin pensar em mí sufrir.”
Com voz melancólica, procurava expressar o que havia de mais latino-americano e erótico, triste e alegre no espírito da música popular cubana.
Finalmente, quando a ansiedade obrigava-o a pedir um uísque duplo, Maite surgiu com um belo sorriso – e disse, os lábios quase colados no ouvido de seu marido:
“Eu jamais trocaria esta noite por nenhuma outra, pois Bola de Nieve é a nossa pátria.”
Ele sorriu com o gracejo sério de sua companheira e, depois de beijá-la repetidas vezes, falou – e o que ele disse era uma reverência calorosa:
“Escutemos, pois, a nossa pátria.”
E, naquela noite, desde que começara as suas excursões pelo mundo, Bola de Nieve cantou e cantou e cantou – como nunca cantara antes.