Estou tentando criar o hábito saudável de andar no parque. Não correr feito um maluco, o que só me tiraria o fôlego e a dignidade na frente dos outros, pedindo arrego e água desesperadamente. Também não sou daqueles que levam pesos imensos e se exibem com seus músculos, mesmo porque não os tenho para mostrar nem se eu quisesse. Só vou lá andar, como mais um daqueles tiozinhos que colocam uma camisa velha e uma meia branca cujo cano vai até o meio da canela. Eu me misturo, assim, à massa.
Venho descobrindo que andar no parque, além de fazer bem para a saúde do coração e dos pulmões, também pode ser uma experiência antropológica. É impressionante a quantidade de tipos humanos que passam por você na pista de caminhada, que andam pelos gramados, que se sentam nos quiosques bebendo sua água de coco. São figuras que nos dão uma boa dimensão da diversidade do ser humano, do como nossa espécie pode ser diferente de indivíduo para indivíduo e do quanto essa variedade é rica e interessante.
“Venho descobrindo que andar no parque, além de fazer bem para a saúde do coração e dos pulmões, também pode ser uma experiência antropológica.”
Dia desses, em um mesmo fim de tarde, topei com um monte de gente sobre quem fiquei imaginando como seriam suas histórias, suas vivências, as razões que as tornaram as pessoas que são. Duas amigas, por exemplo, andavam apressadas e, de vez em quando, paravam para tirar selfies, registrando seus esforços aeróbicos nas redes sociais. Elas paravam, eu as ultrapassava; elas voltavam em passo acelerado a me alcançar e passar à frente. Nesse vaivém, pesquei parte de uma conversa: “Ela comprou apartamento porque não gasta como a gente não. Para ela, salão é uma vez por semana só e tem dois perfumes, no máximo. E não compra esse tanto de roupa que a gente compra”, observou uma. Ao que a outra respondeu: “Ah, é? Será que isso faz tanta diferença assim?” E lá se foram as duas, falando do imóvel que não adquiriram.
Depois passou por mim um sujeito de idade indefinível que parecia mais um ser dos gibis da Marvel. Grandalhão, cara fechada atrás de óculos escuros estilosos, andar decidido, jeitão de mau. Dando voltas em ritmo acelerado e observando as pessoas que passavam por ele com certa obsessão, levantei a hipótese de o sujeito não ser um simples praticante de caminhada e sim alguém que estava montando uma campana.
“Duas senhoras também estavam passeando no parque. Na verdade, mais conversavam que andavam. Animadas, davam sonoras gargalhadas, possivelmente falando mal de alguma conhecida, contando uma história cabeluda da família, compartilhando pequenos segredos num típico papo de amigas. O bem que faz ir para o parque levar um dedo de prosa, não é mesmo?”
Duas senhoras também estavam passeando no parque. Na verdade, mais conversavam que andavam. Animadas, davam sonoras gargalhadas, possivelmente falando mal de alguma conhecida, contando uma história cabeluda da família, compartilhando pequenos segredos num típico papo de amigas. O bem que faz ir para o parque levar um dedo de prosa, não é mesmo?
Ali, uma mãe chamava atenção da filha que insistia em brincar na pista dos ciclistas. Acolá, dois meninos se arriscavam em manobras de skate, sem muito sucesso e vários tombos. Em outra parte, um pai, agachado, conversava com o filho de 4 anos tentando convencer o garoto que era hora de voltarem para casa. Mais adiante, um cachorro miudinho se esforçava, com a língua de fora, em acompanhar o trote de sua dona e de outro cão, bem maior. As cenas se repetiam a cada passo, a cada metro, a cada sombra.
Andar no parque é uma excelente forma de observar o que acontece à nossa volta, as pessoas que dividem este mundo louco com a gente. Depois de observar, percebi que também sou observado. Alguns passam por mim e reparam que minha barriga está proeminente. “Este daí precisa emagrecer”, devem pensar muitos. Outros olham meu tênis azul e odeiam a cor. “Que coisa mais estatalada!” Ando sozinho e já flagrei olhares de piedade. “Coitado, não tem amigos.”
“Depois de observar, percebi que também sou observado. Alguns passam por mim e reparam que minha barriga está proeminente. “Este daí precisa emagrecer”, devem pensar muitos.”
Nada como um passeio no parque! Lugar bom para pensarmos sobre nossa própria vida, para imaginarmos a vida dos outros, para cogitar o que meros desconhecidos pensam de nós. É bom até para fazer crônicas de vez em quando.