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Obra de Jose Pancetti
Obra de Jose Pancetti
Obra de Jose Pancetti

Luís Araujo Pereira em Espirais Professor e escritor | Publicado em 7 de abril de 2017

Luís Araujo Pereira
Professor e escritor
07/04/2017 em Espirais

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Travessia

Aos poucos, os contornos das casas e da torre da velha igreja iam ficando menos nítidos, enquanto o BahiaStar, com o seu motor a diesel de 650 cv, singrava pela baía de São Marcos, balançando e avançando lentamente, em direção à cidade de São Luís.

Fazia uma bela tarde. Nesgas de sol, nuvens baixas e mormaços compunham a paisagem que poderia ser assinada por um pintor de marinhas. Uma brisa soprava sem afobação. O mundo nunca seria melhor senão naquela balsa, naquela tardinha, naquele momento de travessia, entre a umidade e a oscilação, entre o porto e as avezinhas que singravam, elas também, ao seu modo, em volteios elegantes pelo ar.

Para tornar mais plástico aquele céu, um pássaro comedor de peixes − as grandes asas abertas exibiu-se em seu voo, como se não quisesse nada naquele instante com o mar.

“Para tornar mais plástico aquele céu, um pássaro comedor de peixes  as grandes asas abertas exibiu-se em seu voo, como se não quisesse nada naquele instante com o mar.”

A mulher que estava comigo apontou-me um grande cargueiro. Logo em seguida, vimos outro e mais outro e outro mais, fundeados na baía, como barquinhos num desenho infantil. Nós estávamos passando pelas águas dos grandes negócios, ou seja, pelas águas que sobem e descem, todos os dias, nas marés que repetem, como uma metáfora perversa, o movimento do mundo que envolve ganhos e perdas, miséria e glória.

Todas as vezes que convivo com o mar, penso sempre nas caravelas que saíam da Europa para ancorarem em terras longínquas, após enfadonhos meses de viagem, nos quais tudo podia representar o temor do fim, quando o mar se encrespava ou quando os ventos não sopravam…

Mal saindo da Idade Média, o europeu do período das grandes navegações devia transportar consigo todo tipo de superstição e fé. Nessas ocasiões, costumo pensar em Hans Staden, prisioneiro dos tupinambás. A hostilidade que ele experimentou no Novo Mundo não se compara à boa vida que Villegagnon teve entre os tamoios.

A Europa do século XVI construiu um imaginário sobre o nosso mundo que provavelmente não incluía, antes das excitantes e lamentosas partidas, o sentimento do fracasso. Esse imaginário só passou a ser precioso a partir do momento em que foi escrito no retorno, sob o calor da lareira, quando o recurso da memória, das lembranças e, quem sabe?, de uma saudade disfarçada, pareciam dar um sentido à vida aventureira nos trópicos. Imaginário que conhecemos por causa dos grandes paisagistas, retratistas e cronistas dessa época: Debret, Rugendas, Eckhout, Post, Saint-Hilaire…

Foi assim que Hans Staden legou-nos um relato sobre a sua experiência entre os canibais. De outro modo, ao aportar em 1555, Villegagnon revelou-nos o desejo de ter fundado no litoral fluminense uma extensão de sua pátria, na tentativa militar de implantar a França Antártica, uma colônia para os calvinistas, outra utopia daqueles tempos heroicos.

“A Europa do século XVI construiu um imaginário sobre o nosso mundo que provavelmente não incluía, antes das excitantes e lamentosas partidas, o sentimento do fracasso.”

Eu percebia a fachada geométrica do meu hotel, construído na ponta da praia, no sentido sul, as luzes tremeluzentes de suas minúsculas janelas. De outro ângulo, eu via também fachadas e pontos luminosos de outros prédios disseminados pela orla, enfileirados como pontos em um bordado, feitos por mãos de artesãs hábeis, representando ingenuamente o cair da noite.

Afaguei a mulher que me acompanhava e, dessa vez, apontei-lhe uma jangada que passava a bombordo, com três tripulantes remando em braçadas simétricas.

“Afaguei a mulher que me acompanhava e, dessa vez, apontei-lhe uma jangada que passava a bombordo, com três tripulantes remando em braçadas simétricas.”

Diante do contraste, ela sorriu e disse que gostaria de ir mais tarde a um restaurante que servisse frutos do mar. Em seguida, repousou a cabeça em meu ombro e, quase dormindo, esperou o cais, e eu pensei num chardonnay refrescante…

Nós estávamos, finalmente, aportando em São Luís.

Durante a travessia, a despeito das minhas impressões sobre a presença europeia, eu não conseguia esquecer o menino quase desnudo que ficara para trás, bem longe, entre as ruínas, naquela bela e antiga ilha de onde voltávamos −  esse menino conduzindo com dificuldade as suas cabras por um morro íngreme e verde, um verde que, mesmo de longe, eu via que se misturava, mirrado, às pedras.

Tag's: crônica, literatura, São Luís

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