O indígena sonhou os seres minerais, vegetais e animais crescendo parentes.
O hindu mergulhou na mente humana e a transmudou espiritualmente em textos, imagens e meditações, escrituras de vida, morte e caminho moral, migradas e consubstanciadas em evolução budista.
Assim a sina virou percurso e o karma foi transformado pelo dharma.
Os povos mesoamericanos devotaram-se a calendários cíclicos. Navegadores da Oceania cruzaram o mundo singrando os mares.
Filósofos gregos contemplaram do Mediterrâneo o Universo e as propriedades da vida – e o portal helênico adivinhou o Oriente.
Egípcios e árabes cultivaram matemática e astronomia desvendando o Cosmos.
A Idade Média sustentou o holismo até a Renascença, sob um morticínio por guerras religiosas e pela peste, preservando manuscritos de sabedoria milenar.
Newton, Descartes e os mecanicistas empíricos abriram o portal do desenvolvimento e usufruto do reducionismo em resultados científicos concretos, com decorrências de intensa mutação social, sem prever os efeitos futuros e remotos sobre a psique humana e a saúde da ecologia dos seres e de seus hábitats.
Filósofos europeus debruçaram-se sobre a ontologia, enquanto pensadores viviam dramaticamente visões conflituosas sobre imanência e determinismo historicista.
No alvorecer do século 19, Humboldt divisou do alto do Chimborazo no Equador o estado Gaia do Planeta. Ele denunciou o colonialismo e a escravidão, sendo por isso lhe interditada a Índia pelos ingleses. Graças a isso, perto do fim de sua vida, alcançou a Sibéria, detendo-se antes da fronteira da Mongólia em barreira epidêmica.
Assim biografou Andrea Wulf em A Invenção da Natureza.
Von Martius seguiu-lhe os passos ao chegar com a missão austríaca trazida pela Imperatriz Leopoldina e atravessar o gigante da América do Sul, divisando os biomas brasileiros em sua jornada à Colômbia.
No século 20, físicos criaram a teoria da relatividade e a física quântica, utilizadas na bomba de Hiroshima, na energia nuclear e em aventuras ao espaço sideral.
Paleontologistas e historiadores perceberam que a geologia e a história ambiental envolvem os seres em transformações da ordem fundamental definidora da vida. Investigadores debatem inerências da ordem e do caos.
Cormac Cullinan, o advogado do Direito Selvagem, escreveu desde a África do Sul no alvorecer do novo milênio, alimentado pela obra de um cristão místico historiador que plantou obra semente para resgatar a amplitude humana face ao Ambiente.
Ele notou em África sobre o esquecimento do nosso estado humano original integrado à natureza, a partir de Ralph Metzner – um psicólogo onírico que estudou o efeito de alucinógenos – o conceito de pandemia psicológica.
Depois foi à Bolívia consubstanciar declaração em encontro internacional pelo respeito à Terra. E falou em Cochabamba sobre a metamorfose, DNA e dominação.
Os Andes celebram a Terra Mãe. A cordilheira comunica-se com a Amazônia.
Fritjof Capra anotara em A Teia da Vida que a visão dos sistemas vivos em ecossistemas viventes é em essência espiritual. Ele ensinou que a ciência também se manifesta por metáforas.
A Carta da Terra foi mais uma decorrência da Rio 92, um passo pouco difundido.
Materialismo, nacionalismos e autodeterminação entrechocam-se no século 21 com dimensões ecológicas, nas junções e tensões de Ocidente e Oriente.
A China, outrora berço do taoísmo, tendo sido influenciada pelo materialismo histórico, segue inexoravelmente em projetado cinturão de nova rota da seda, marcha econômica e social intercontinental que impactará muitos, afetando a vida.
Climatologistas alertam para as tendências de eventos extremos e desertificação no mundo partido entre níveis de desenvolvimento e modos de existência, norte e sul.
Os oceanos estão invadidos pelo plástico. Avança a ação poluidora da terra nullius. O planeta vive uma sexta grande extinção de espécies vivas.
O transporte marítimo move a maior parte do comércio mundial, com imensa emissão de poluentes em território internacional, como mostrou o documentário Freightened, exibido na Mostra Ecofalante.
Ecologistas mantêm acesa a esperança na chama do conhecimento presente, nas ações de conservação e integram o debate político.
Ressurgem e renovam-se epistemologias. Juristas, economistas e outros debruçam-se sobre como alcançar uma sociedade ecológica em meio ao cenário consumista que envolve os seres humanos entre afluência e miséria. Seria uma revolução comparável à descoberta de Copérnico, com muitas pedras no caminho. O planeta não existe em torno do homem. Não foi desavisada, a pandemia.
Da integração entre pessoas, natureza, arte e ciência vem nova pedagogia do espírito. A isso contribui a imaginação e o encontro. Um dos foros de sementes, hoje raro, foi o Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Em Selvagem, a editora Dantes oferece, desde encontros seminais que organizou no Teatro Tom Jobim naquela instituição – a partir de pensamento, trabalho constante e participação aberta –, compartilhar repositório atual pela cura do afastamento.