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Rogério Borges em Margem Jornalista e professor | Publicado em 2 de fevereiro de 2017

Rogério Borges
Jornalista e professor
02/02/2017 em Margem

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O mundo é desarmônico

O título da crítica que um jornalista nervoso fez no tabloide The New York Post num distante 1944 dá a dimensão do quão demolidor era aquele texto: “Ela é a pior cantora do mundo?” A pergunta retórica referia-se a Florence Foster Jenkins, milionária que herdou uma fortuna de seu primeiro marido e que usou boa parte do dinheiro para incentivar a vida musical de Nova York na primeira metade do século passado. Em uma espiral de ilusões, porém, ela, admiradora de óperas e árias, também quis se aventurar nos palcos interpretando tais obras. O problema é que ela era totalmente desafinada.

Essa história, uma mescla de drama e comédia, é contada no cinema pelo diretor Stephen Frears no filme Florence, que rendeu a Meryl Streep sua vigésima indicação ao Oscar – recorde absoluto. No Brasil, a saudosa Marília Pêra havia dado vida nos palcos a essa personagem singular, que trazia consigo uma série de paradoxos que nos fazem pensar sobre opiniões forjadas sem concessões. Florence, de fato, não tinha o dom do canto, apesar de absolutamente não perceber isso. Ela alcançava notas altíssimas, mas se atrapalhava na afinação, na respiração necessária para transformar tal potência em algo harmônico.

Meryl Streep e Hugh Grant em Florence: um amor verdadeiro, mesmo com infidelidade. / Foto: Divulgação

Meryl Streep e Hugh Grant em Florence: um amor verdadeiro e infidelidade. / Foto: Divulgação

Em uma curiosa apresentação no templo da música novaiorquina – o lendário Carnegie Hall – Florence soltou a voz e foi alvo, num primeiro momento, de chacotas, dado o som agudíssimo que saía de sua garganta. Faltavam-lhe ritmo, melodia, quase tudo o que se exigia de uma cantora lírica. Quase tudo… Depois de intervenções deseducadas, veio a solidariedade. Os aplausos tomaram a então casa de shows mais famosa dos EUA. Todos ali – menos Florence – sabiam que ela não cantava bem, mas aplaudiam mesmo assim, menos por piedade e mais por empatia.

O jornalista do Post não viu assim. Saiu no meio do espetáculo e detonou a cantora. Ela, ao ler a crítica, teve uma síncope e a sífilis, que contraíra na noite de núpcias de seu primeiro marido, retornou com tudo. É uma saga triste, que revela a fragilidade daquela mulher endinheirada e que encontrava a felicidade no autoengano, cultivado pelo segundo marido, o empresário Clair Bayfield. A atitude daquele inglês poderia parecer oportunista, pois era sustentado pela milionária. A verdade, porém, é que não era. Clair amava Florence de verdade, cuidava dela, fazia de tudo para que se sentisse bem.

“Foi traída e enganada pelo marido? Sim. Mas ninguém cuidaria dela com tanto carinho como ele. Um carinho genuíno, autêntico, dedicado. A infidelidade dividia, naquela relação, espaço com um amor fraterno”

Novamente surge a incômoda constatação de que nem tudo o que parece ruim de fato o é. Clair mantinha uma amante, romance do qual a inocente Florence nunca tomou conhecimento. Foi traída e enganada pelo marido? Sim. Mas ninguém cuidaria dela com tanto carinho como ele. Um carinho genuíno, autêntico, dedicado. A infidelidade dividia, naquela relação, espaço com um amor fraterno, um esforço enorme em fazer a esposa a continuar a sonhar, o que, para ela, significava continuar vivendo.

A pergunta que serviu de título àquela matéria deve ser encarada, portanto, sob outros prismas. Florence era a pior de todas? O pior, então, seria não ter talento técnico? Mas ela financiou os concertos do maestro Arturo Toscanini, patrocinou espetáculos teatrais, ajudou a manter o próprio Carnegie Hall aberto. Como emprestar o adjetivo “pior” a alguém que fez o que ela fez? E o marido, era um safado? Em muitos aspectos, sim. Mas foi o “pior” companheiro que Florence poderia ter? Longe disso.

“Sei que é meio chato relativizar, mas, para se fazer justiça, às vezes é preciso abrir mão de conceitos muito arraigados e rígidos, da escolha mais habitual entre condenar e absolver. Há uma vasta região intermediária entre esses polos em nossas vidas”

Sei que é meio chato relativizar, mas, para se fazer justiça, às vezes é preciso abrir mão de conceitos muito arraigados e rígidos, da escolha mais habitual entre condenar e absolver. Há uma vasta região intermediária entre esses polos em nossas vidas. A história pungente da ricaça de Nova York prova isso. A cantora desafinada que fez sucesso, vendendo milhares de cópias de uma gravação sonoramente horrorosa. Paradoxal e fora dos padrões. O marido de vida dupla que esteve com ela até o fim, protegendo os sonhos da mulher que traía. Raro e estranho. Sim, o mundo é desarmônico como os sonidos agudos emitidos por Florence.

Tag's: cinema, Florence, Meryl Streep, Música

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