• Sobre Ermira
  • Colunas
    • Aboios
    • Arlequim
    • Arranca-toco
    • Chapadão
    • Chispas
    • Dedo de prosa
    • Errâncias
    • Especial
    • Espirais
    • Florações
    • Margem
    • Maria faz angu
    • Matutações
    • Miradas
    • Mulherzinhas
    • No Goiás
    • NoNaDa
    • Pomar
    • Rupestre
    • Tabelinha
    • Terra do sol
    • Veredas
  • Contribua
  • Colunistas
  • Contato
  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter

ERMIRA

  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter
  • Sobre Ermira
  • Colunas
    • Aboios
    • Arlequim
    • Arranca-toco
    • Chapadão
    • Chispas
    • Dedo de prosa
    • Errâncias
    • Especial
    • Espirais
    • Florações
    • Margem
    • Maria faz angu
    • Matutações
    • Miradas
    • Mulherzinhas
    • No Goiás
    • NoNaDa
    • Pomar
    • Rupestre
    • Tabelinha
    • Terra do sol
    • Veredas
  • Contribua
  • Colunistas
  • Contato
Imagem: La Soirée sous la Lampe (Pierre Bonnard)
Imagem: La Soirée sous la Lampe (Pierre Bonnard)
Imagem: La Soirée sous la Lampe (Pierre Bonnard)

Luís Araujo Pereira em Espirais Professor e escritor | Publicado em 16 de novembro de 2017

Luís Araujo Pereira
Professor e escritor
16/11/2017 em Espirais

  • Compartilhar no Twitter
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Google +
  • Compartilhar no WhatsApp
← Voltar

Terças-feiras

Já era muito tarde, quando comecei a rabiscar os primeiros sinais sobre o papel e escrevi, sem querer, a seguinte frase, como uma asneira que procura a sua exegese:         

“O mal é radical.”

Num zumbido, sem mais nem menos, essa sentença irrompeu de um lugar recôndito do meu cérebro. Examinando depois a caligrafia e pensando o seu sentido, lembrei-me da mulher, não só bonita como inteligente   −  e por fim entendi por que a escrevera, num surto compreensível de lucidez perplexa.

A beleza e a sabedoria formam o par ideal do pensamento e os contornos das estátuas gregas. Talvez seja por isso que procuro a órbita em torno da qual estar ali, ao lado dessa mulher, tomar chardonnay e ouvir As Quatro Últimas Canções, de Richard Strauss, significassem um privilégio e, sem querer me gabar, um milagre que atinge apenas os corações mais singelos. Na homenagem ao compositor que escrevera canções tão condoídas, que sempre vão torturar um espírito que convive com a brandura e a corrosão, eu lhe disse:

“Eu troco então dois Sartre por um Kant.”

Com os seus óculos de lentes grossas, as coxas apertadas num short curto, as pernas apoiadas ora no sofá, ora na mesa de centro, ela retrucou, lamentando-se mais do que reconhecendo o horror que a frase inspirava-lhe:

“Não existe Kant para principiantes.”

A filosofia não é só a luz que cega os espíritos incautos −  ela inclui ainda a língua bífida e a sombra que flutua sobre a lombada dos clássicos.

“Se algum dia eu ler a Crítica da Razão Pura e compreender como pensava um alemão do século 18, talvez entenda as loiras de Goiânia que dirigem os seus carrões com vidros escuros levantados.”

Imediatamente, ela reclamou:

“Assim, você não faz justiça nem ao Kant, nem às loiras.”

Para não parecer tão cretino, eu disse esta frase boba, para encerrar o assunto:

“As loiras de Goiânia, coitadas, nunca vão ler os filósofos que você ama!”

Com o intuito de proteger a minha vocação hedonista, eu não queria perder-me nos labirintos da filosofia. Naquela noite, eu estava muito mais para o néctar de Paulo Vanzolini do que para o pólen dos textos preciosos.

O samba está repleto de pensadores e de bons sujeitos. Ele não é só uma canção −  é também uma explicação do que somos e sentimos, do lugar de onde viemos e onde construímos a nossa conformidade. Na sua alegria de viver o espanto da vida, Ataulfo Alves criou uma academia.

Não sei quantos homens podem gabar-se de ter encontrado um lugar onde sua cabeça não esteja a prêmio. Nem onde o seu paletó seja amarrotado, nem onde  o seu copo fique vazio. Nem onde Carissimi valha mais do que Marin Marais.

Todas as terças-feiras, quase todas, a bem da verdade, quando era possível, eu ia para esse lugar −  essa Terra do Nunca, essa  sala que me protegia da efemeridade vulgar, esse lugar enfim que me colocava ao abrigo do medo de perder-me pelos túneis medonhos nos quais diariamente trafegamos.

(Esses túneis que atravessamos todos os dias como se procurássemos mais adiante futuros desastres.)

E, ali, entre a ficção e a delicadeza, naquele lugar que não tem nome, eu reinventava as minhas leituras, os minúsculos tremores, o gesto distraído de colocar a mão na cabeça, a partícula ínfima na qual irei tornar-me um dia, sem despender o menor esforço para ganhar o sono dos tempos que nunca terão fim  − esse sono do qual não se acorda…

Tag's: crônica, Kant, Luís Araujo Pereira, Sartre, Strauss, Vanzolini

  • O mundo caduco de Bob Dylan e Carlos Drummond de Andrade

    por Paulo Manoel Ramos Pereira em Veredas

  • A pluralidade histórica e os sistemas de valor

    por Marielly Romeu Marcelino em Matutações

  • Flaubert, Machado e Proust: um triângulo estético da modernidade

    por Gilberto G. Pereira em Veredas

  • Compartilhar no Twitter
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Google +
  • Compartilhar no WhatsApp

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.

1 comentários em “Terças-feiras”

  1. Maria Elisa França Rocha disse:
    17 de novembro de 2017 às 17:05

    Como você escreve bem, Luís! Delícia de leitura. Obrigada.

    Responder

Deixe um comentário (cancelar resposta)

O seu endereço de e-mail não será publicado. Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

ERMIRA
  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter