• Sobre Ermira
  • Colunas
    • Aboios
    • Arlequim
    • Arranca-toco
    • Chapadão
    • Chispas
    • Dedo de prosa
    • Errâncias
    • Especial
    • Espirais
    • Florações
    • Margem
    • Maria faz angu
    • Matutações
    • Miradas
    • Mulherzinhas
    • No Goiás
    • NoNaDa
    • Pomar
    • Rupestre
    • Tabelinha
    • Terra do sol
    • Veredas
  • Contribua
  • Colunistas
  • Contato
  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter

ERMIRA

  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter
  • Sobre Ermira
  • Colunas
    • Aboios
    • Arlequim
    • Arranca-toco
    • Chapadão
    • Chispas
    • Dedo de prosa
    • Errâncias
    • Especial
    • Espirais
    • Florações
    • Margem
    • Maria faz angu
    • Matutações
    • Miradas
    • Mulherzinhas
    • No Goiás
    • NoNaDa
    • Pomar
    • Rupestre
    • Tabelinha
    • Terra do sol
    • Veredas
  • Contribua
  • Colunistas
  • Contato

Luís Araujo Pereira em Florações Professor e escritor | Publicado em 26 de abril de 2018

Luís Araujo Pereira
Professor e escritor
26/04/2018 em Florações

  • Compartilhar no Twitter
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Google +
  • Compartilhar no WhatsApp
← Voltar

Cinco poemas de Alexandre O’Neill

(Curadoria de Luís Araujo Pereira)

[1]

Soneto

No céu duma tristeza cor de farda,

Uma angústia de nuvens se desenha.

O amor já morreu: que o tempo venha

Desmantelar o que a memória guarda.

 

Jogai!, jogai! Quem não jogar não ganha

Nem perde. É a última cartada.

Eu aposto na vida, mesmo errada.

Talvez outro destino me sustenha.

 

Avião de Lisboa para o mundo,

Apaga-me a tristeza com as asas,

Tão nítidas no céu em que me afundo!

 

Depois desaparece atrás das casas

E deixa-me o azul, o azul profundo,

E duas nuvens de razão tocadas.

̻ ̻ ̻

 

[2]

Gato

Que fazes por aqui, ó gato?

Que ambiguidade vens explorar?

Senhor de ti, avanças, cauto,

meio agastado e sempre a disfarçar

o que afinal não tens e eu te empresto,

ó gato, pesadelo lento e lesto,

fofo no pêlo, frio no olhar!

 

De que obscura força és a morada?

Qual crime de que foste testemunha?

Que deus te deu a repentina unha

que rubrica esta mão, aquela cara?

Gato, cúmplice de um medo

ainda sem palavras, sem enredos,

quem somos nós, teus donos ou teus servos?

̻ ̻ ̻

 

[3]

O morto

O morto, assim barbeado,

assim vestido, calçado,

está pronto a ser enterrado,

está pronto a ser olvidado,

 

que ele agora é uma coisa,

é de fora para dentro.

Só aos vivos falta o tempo.

A ele não, que é uma coisa.

 

Não tem lazer, que fazer,

nem aflição ou dívida.

Qualquer destino lhe serve

à maravilha.

 

E tanto se lhe daria

ser o defunto na sala,

como carcaça na vala

ou objecto de poesia.

 

Mas não se esquecem os vivos

de condimentar o morto.

Para que dele não fique

mais que o osso?

̻ ̻ ̻

 

[4]

Três carneiros do Tejo

Nasce na serra de Albarracim, em Espanha,

entra-nos em casa pelo Ródão,

arremeda-nos a sua galadela,

depois acalma, vai deitando corpo,

e aqui, já todo ancho, o atravesso

diariamente, eu, o ribeirinho

que traz a mão na estiva de palavras

no outro lado e a cabeça algures.

 

Cada um com sua nuvem rente à boca,

que em alguns é o cúmulo da prosápia,

das leiras do sono nós todos arrancamos

pra Lisboa, a tão estremecida,

e ao barbeirinho opomos catadura

de quem está zangado com a vida.

 

E estamos.

 

*

 

Dragado de conversas, Tejo, darias mais calado

à nossa companhia,

mas calados só eu e a rapariga

que passou a noite a vadrulhar,

deu um pulo à tia e volta prà cidade

já quase na pele doutra pessoa,

retocado o bâton, aproveitada a olheira,

reposto o seio no lugar, tão sobranceiro!

 

É de dia caixeira, aposto eu.

Não vale que tu viste, digo eu eu.

 

*

 

Ó Tejo nunca inaugurado, nesta praça

devia haver comércio, esplanadas, mesas

onde eu assentaria o cotovelo e, a cafés,

diria, versejando, quem não és.

 

Com as Dez Odes do Dr. Armindo,

que, aliás, são um poema lindo,

ó Tejo vaidosão tu transbordaste,

tu não te contiveste, tu não te aguentaste!

Mas eu, Tejo continuado, nesta praça

minist’rial que mais te posso dar,

a ti que vens de Albarracim, meu espanhol,

que passaste Almourol,

que passaste Pereira Gomes e Redol,

senão a frase sim ou não ouvida

com este meu ouvido, com esta minha vida,

a um rapaz que, sem malícia, veio,

da sombra sei lá de que sobreiro,

para dar em alguém, cá na cidade:

 

Ser da polícia,

dá cantina, barbeiro, autoridade.

̻ ̻ ̻

 

[5]

o chapéu de tchekov

tchekov anton rebocava o seu

pulmão pelos ares da crimeia

mais ou menos quando a engomadeira

de cesário passava os seus pulmões

pelo carvão do ferro

 

gorki vai visitá-lo palmilhá-lo e à cancela

observa-o no umbroso jardim chapéu na mão

aparando no côncavo um cambiante raio

do sol que pela folhagem trémula se infiltra

 

gorki retém-se vê o tostão de sol

cair no chapéu de anton neto de servos

vê anton virar tac o chapéu e espreitar para dentro

como quem tirado o chapéu nele procurasse

a sua própria cabeça

 

tchekov brincava com o alheio sol

na pessoal solidão

 

Perfil

Alexandre Manuel Vahia de Castro O’Neill de Bulhões nasceu em Lisboa no dia 19 de dezembro de 1924 e morreu na mesma cidade em 21 de agosto de 1986. Após concluir o Liceu, cursou a Escola Náutica, mas acabou tornando-se autodidata. Foi um bem-sucedido redator de propaganda, profissão em que atuou até o fim da sua vida.  Pela suas afrontas à ditadura de Salazar, foi preso pela Pide, a polícia política do regime, permanecendo detido por mais de 20 dias. Em 1948, ao lado de Mário Cesariny, José-Augusto França, António Pedro, entre outros, participou da criação do Grupo Surrealista de Lisboa que, mais tarde, por divergências internas, se desmembraria. A sua obra poética foi criada com base na estética surrealista, embora tenha se aproximado também das experiências vanguardistas, como o concretismo. A sua estreia na literatura ocorreu em 1948, com o livro de poemas A Ampola Miraculosa, que inaugura  os “Cadernos Surrealistas”. Vieram em seguida os seguintes títulos: Tempo de Fantasmas (1951), No Reino da Dinamarca (1958), Abandono Vigiado (1960), Poemas com Endereço (1962), Feira Cabisbaixa (1965), De Ombro na Ombreira (1969), Entre a Cortina e a Vidraça (1972), A Saca de Orelhas (1979), As Horas Já de Número Vestidas (1981), Dezanove Poemas (1983) e O Princípio de Utopia, O Princípio de Realidade, seguidos de Ana Brites, Balada Tão ao Gosto Popular Português & Vários Outros Poemas (1986). Em 2012, a editora Assírio & Alvim lançou a 6ª edição de suas  Poesias Completas. Publicou ainda dois livros de crônicas, fez traduções e organizou antologias.

 

Tag's: Alexandre O'Neill, poesia, poesia portuguesa, Portugal, regime salazarista, surrealismo, vanguardismo

  • Da Vinci, o único

    por Gérard Emmanuel da Silva em Rupestre

  • Amizade e poesia

    por Da Reportagem/Ermira em Dedo de prosa

  • É possível a prática filosófica em meio às novas tecnologias de informação?

    por Rogério Paes Dalbem em Matutações

  • Compartilhar no Twitter
  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no Google +
  • Compartilhar no WhatsApp

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.

Deixe um comentário (cancelar resposta)

O seu endereço de e-mail não será publicado. Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

ERMIRA
  • Instagram
  • Facebook
  • YouTube
  • Twitter