No final de 2009, quando eu ainda trabalhava no jornal O Popular, o artista plástico e ex-publicitário Roosevelt de Oliveira Lourenço, o Roos, esteve na redação para divulgar seu trabalho, sem intermediários. Há algum tempo afastado do circuito de exposições, estava ali para contar que realizaria uma individual com trabalhos inéditos no extinto Beco das Artes, no Setor Oeste. Conversamos na recepção longamente pela primeira vez. Apesar de admirar seu trabalho composto de Quixotes, palhaços, bêbados e frequentadores da noite, não o conhecia pessoalmente.
Depois de falar sobre o seu trabalho e a rotina no ateliê, Roos me convidou para visitá-lo, para ver de perto suas criações. Nascia ali minha empatia pelo homem simples, sem afetação, o desenhista brilhante e pintor de características impressionistas admiráveis.

Roos: busca pela simplicidade na fase final da carreira
Artista de alma inquieta, Roos morreu nesta quinta-feira, dia 6 de junho, aos 72 anos, de infecção generalizada provocada por insuficiência renal, deixando uma enorme lacuna nas artes visuais de Goiás. Mesmo adoentado, Roos pintava todos os dias. Nos últimos tempos, optou pelas telas menores, lembra o amigo Alexandre Liah, pois eram mais fáceis de manusear. Naturezas-mortas, cantos de mesa e flores em cores vibrantes, alegres e coloridas em sua maioria. Retomou a figura dos palhaços, uma das marcas de seu trabalho, e motivo de uma crítica que o deixou contrariado, afastando-o do tema. “Seu trabalho estava cada vez mais simples, mais solto. Ele não estava preocupado com primazia, com preciosismo. Queria somente pintar. Dizia que o pessoal gosta de cores, por isso investia nelas”, revela Liah.
Roos buscava a síntese da sua arte, e estava chegando ao ponto que desejava com a abstração. Uma de suas últimas Madonas, postada na sua página no Facebook, é um exemplo desse objetivo. A mais recente tela de palhaços com semblante angustiado também encontra-se na página, assim como a pintura de um jarro de flores impressionista.
Roos dedicava a maior parte do seu tempo ao ateliê no Setor Universitário, onde também morava. Atravessava madrugadas com seus pincéis. Quando iniciava um trabalho não queria mais parar. Muitas vezes, via o dia raiar da janela. Outras de suas atividades eram os encontros semanais do Conselho Municipal de Cultura, do qual era representante das Artes Visuais. Cultivava a solidão. Mas não era um homem solitário. Gostava de bater pena nos shoppings. Apreciava um cafezinho na companhia de amigos nos fins de tarde. Sentia-se à vontade, apreciando o vaivém de pessoas.

Tela recente retratando a figura melancólica de um palhaço: tema recorrente
Em 2018, a convite de Alexandre Liah, participou do estande da Feira de Artes de Goiás (Fargo), ao lado de Liah, Tolentino, Tai Hsuan-An e Amaury Menezes. Trabalhos anteriores estão expostos na coletiva em homenagem à marchande Célia Câmara, no Hospital Geral de Goiânia, organizada pela artista plástica Helena Vasconcelos, inaugurada dia 4 de junho. Foram suas últimas exposições.

Vaso de flores, outro tela mais recente: pinceladas impressionistas

Cachorrada, trabalho de 2018: entre o figurativo e o abstrato
Companheiro do Conselho Municipal de Cultura, o produtor cultural Carlos Brandão considera as telas retratando bêbados e frequentadores de bares como uma das melhores fases do artista. “Roos era muito bem-humorado. Vai nos deixar muita falta”, lamenta. Marchande e amiga pessoal do artista, Eliane Miclos diz que ele era um grande questionador da alma humana. Para ela, os bêbados que Roos pintou são figuras muito interessantes. “São obras maravilhosas”, diz a marchande. “Admirava muito seu trabalho, vendi muitas obras dele”, afirma. Aposentado, Roos vivia de sua arte, apesar das dificuldades do mercado.
Simplificação
Artista inquieto, Roos sempre se dedicou à experimentação, a busca pela simplificação do desenho, que evoluía a cada nova fase. Se atualmente apostava nas tonalidades vibrantes, antes utilizara o preto, o branco e o cinza, que davam uma conotação de gravura. Usou ainda cores desbotadas e neutras. Porém, o desenho e as características impressionistas permaneciam impecáveis. Roos evitava os contrastes. Utilizava uma técnica exclusiva de entrelaçamento que resultava na alternância de cores, tornando sua pintura inconfundível.

Santa Ceia: outro tema sempre explorado por Roos em suas telas. Fotos: Facebook do artista
Nascido em Ipameri (GO), em 1947, Roos fez parte de uma geração muito rica de artistas goianos. Foi aluno de DJ Oliveira no final dos anos 1960. Conviveu com nomes importantes das artes de Goiás. Participou de dezenas de exposições individuais e coletivas em Goiânia, Rio de Janeiro, Vitória, Belém, Brasília e outras cidades. Expôs no 1º Salão Primavera de Brasília, em 1973, e ganhou o Prêmio Aquisição. Em 1974, participou da 9º Bienal de São Paulo, e do 2º Salão Nacional de Artes Plásticas, em 1976, no qual conquistou o Prêmio Aquisição. Integrou o Salão Nacional do Rio de Janeiro e do projeto Arco-Íris da Funarte. Em Goiânia, também ganhou importantes premiações e fez dezenas de exposições sempre muito elogiadas.