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Foto: Divulgação
Foto: Divulgação
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Luís Araujo Pereira em Florações Professor e escritor | Publicado em 17 de julho de 2022

Luís Araujo Pereira
Professor e escritor
17/07/2022 em Florações

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Cinco poemas de Moisés Alves

[Curadoria de Luís Araujo Pereira]

[1]

A mãe de Moisés Oliveira Alves

Minha mãe tem perdido

a memória das coisas.

A minha mãe.


Sou órfão de uma mãe que  já foi

e ao mesmo tempo filho legítimo

de uma mulher que estranho o rosto.

Quando nos abraçamos

formamos um aparato químico-amoroso

que serve só para esse tipo de coisa.

Nossas mãos de antigamente

de antes da primeira imagem sobre a terra

são velhas.

Minha mão nasceu antes de mamãe

e vem rolando nos espaços

como uma irradiação de poema em poema.

A gente tenta manter o céu

sobre nossas cabeças. Nem sempre ganhamos.

Melhor: nem sempre se ganha uma perda.


Diante da mesa ficamos sem assunto.

Tudo quente e não temos conversa.

É alarmante.

A cidade ferve.

Objetos em movimento lento

e com uma estrutura estável

são arrastados pelo vento.

Mãe é onde estamos

Qualquer campo aberto

Mãe.

Viemos no grito.

Fomos espirrados por ele.

Toda nuvem é formada por gritos desviados,

como uma placenta é nuvem condensada. No caminho,

pelo menos seis famílias pediram socorro num país

cujo orçamento soma três trilhões de reais.

A terra é ainda um lugar de grandes possibilidades.


Convido mamãe para escrever um livro

com tudo aquilo que foi brutalmente esquecido

além de bulas de remédio, contas de energia, papéis de pão,

surtos, provérbios, palavras à deriva no ouvido,

confeitado de glacê por cima e um pouco de trigo.

A gente esquece do livro.

Só há tempo para habitar a vida.

Nosso amor ao presente triunfa.


Minha mãe exercita-se

em outras relações sintáticas.

A alma é um bem público.

Todo mundo tem uma na cara.

Quero chorar por ela. Não consigo.

Por nossa alma que também se amplia,

se retrai, alastra-se para fora de nossa casa.

Alma perdida.


O futuro nunca chega

de forma esperada

e em geral não estamos

poeticamente disponíveis.

Batemos a porta no susto.


Ela fica tão leve

sem o peso dos passados

que um dia desses

tenho medo

que confunda a porta de saída

e se desprenda da terra.

A pipa do filho esvoaça.

Mamãe aproveita.

É uma pipa sem rabo

desabando sobre outro endereço

como uma benção.

Que dia esse.

Mangue (2021)

• • •


[2]

carlete jazz band

ouvi na fila

do açougue

que tutano antes

servia para passar

no cabelo


quando deixam

a gente se lambuza

na força alheia


nossa violência é muito

antiga nossa fome também


aliás

violenta-se porque há

variáveis espécies de avidez


eu por exemplo

já cortei com navalha de barbeiro

alguns homens

bichas putas

michês

embora o amor não se corte

a gente espalha o que tem

para outro beco onde o vento sopra

outro norte

e a vida passa outra vez


a vida passa

sem drama e com algumas contas

e subitamente

a gente oferece a mesma coisa

de outra forma

ou vice-versa

desculpa

não sei


com a faca na mão

nem isso que você quer

dá um passo sem te rasgar

de trás para frente


tentam lhe tirar

o direito ao boi

mas esse boi é seu

a história dos pastos

petróleos das mesas

dos subsolos museus

da cama onde você treme

tem a mesma história

da boca que te arrasta

para onde

para quem

Mangue (2021)

• • •


[3]

dinossauro

aos 65 anos

e com quarenta e cinco

de vida militar e depois

civil de polícia do estado da bahia

certamente meu pai

ainda lembra das finitas posturas

que um corpo conquista

isso sentado

isso deitado

ou esse esforço ininterrupto

de mantê-lo na vertical

única verticalidade vital

é um corpo de pé

desde quando eu era chamado

de criança adulta

meu pai sempre foi elogiadíssimo

pelos marginais

justamente por não vê-los

como marginais ou talvez por

ver a si mesmo como um deles

um desviante do bando

um homem na trave

impedindo que o adversário

aniquile sua festa

meu pai disse

após 35 minutos

de conversa no telefone

nunca eu e ele conversamos

a sós por tanto tempo

só pra saber como estamos

meu pai está com medo

não da morte

essa que todos nós portamos

em alguma parte insuspeitável do corpo

mas de perder o samba

no beco do mota

quase no largo do pelourinho

que virá imediatamente após

essa revolta animal da terra

Mangue (2021)

• • •


[4]

meio quilo

assim como uma forma dá

a si mesma mais volume de carne

fazendo o que faz

devoro porcos que outros homens matam

com vinte reais se compram alguns bifes

tem dias que eu sou o porco

um suíno de classe

que um soldado da polícia militar da bahia

se esbalda

tem dias que sou

um dos bichos cercando a caça

Mangue (2021)

• • •


[5]

a pergunta devolvida

fazer

assim uma perda

que sempre escapa

dissimulada


não consigo

reter essa perda

conquistar essa terra estrangeira

retê-la

para pôr no incêndio

das paredes

das caveiras


um resto

de perda

que vem e vai

atlética


tenho fissura

em reconstituir

o que ela pode

o que uma perda faz

inacabada

aberta


uma cartografia das sensações mal qualificadas


um bêbado me dizia

a perda é apenas um acesso

sublime violento

de grande pulsão e beleza


você diz

isso se esbarra na gente

nos carrapata

como um beijo


não consigo responder a coisa nenhuma

apenas devolver a pergunta

indo no que nela queima

Mangue (2021)

Perfil

Moisés Alves nasceu em Salvador (BA) em 1982. É professor adjunto de Literatura do Departamento de Letras e Artes da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e dos cursos de Letras e Cinema e Audiovisual da Unijorge. Fez doutorado em teoria e crítica da literatura e cultura na Universidade Federal da Bahia. Em 2018, foi agraciado com uma bolsa do Goethe-Institut para uma temporada em Berlim, onde apresentou seus poemas. Pela editora Circuito, do Rio de Janeiro, publicou Cadernos de artista: poemas (2017), Onde late um cachorro doido (2017), Escrito e dirigido por Moisés Alves (2018), Coisas que fiz e  ninguém notou mas que mudaram tudo (2018). Em 2021, publicou pela martelo casa editorial, de Goiânia, mangue, livro de poemas. Apresentou e traduziu poesias de Elke Erb, autora alemã, para a revista Cult. Os seus poemas foram publicados no Jornal Rascunho e em vários sites dedicados à poesia. Segundo Miguel Jubé, em nota editorial, mangue percorre “espaços entre uma ‘antibiografia’ e um querer devorar o mundo de imediato”. Em tom assemelhado, na apresentação, Alberto Pucheu afirma que “é um livro em que as pessoas da vida e a vida das pessoas se misturam a seus lugares de proveniência, infiltrando-se genealogicamente umas nas outras, levando-nos a crer que ‘tudo caminha junto’, na intimidade e em público, muitas vezes de maneira trágica, ainda que ‘sem máscaras gregas de proteção'”.

Tag's: Mangue, martelo casa editorial, Moisés Alves, poesia, poesia baiana, poesia brasileira

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