Livros denominados de autoajuda fazem sucesso no mercado editorial, mas provocam desconfiança em quem não aposta em fórmulas simplistas para resolver problemas complexos. Então, esqueça este rótulo quando se deparar com Nem Sapo Muito Menos Príncipe – Sexualidade Masculina – Diálogo para Homens e Mulheres, definido pelos autores Edvaldo Pereira Lima e João Borzino como uma “conversa elucidativa e dinâmica entre um escritor e um médico sexologista”. Melhor explicando, nas palavras de Edvaldo: “Nem Sapo Muito Menos Príncipe modestamente faz algo levemente inovador, que é integrar o trabalho de um jornalista literário ao de um especialista num campo específico, trazendo como resultado um trabalho conjunto que seria de difícil realização exclusivamente só pelo médico ou só pelo escritor”.
O livro, como explicita o título, entra pelo terreno ainda pouco explorado da sexualidade masculina, abordando questões como disfunção erétil, ejaculação precoce, alienação das relações amorosas por perda de autoconfiança, preconceito, machismo e sobreposição de pressões diante de mulheres que exigem dos homens um comportamento distante dos padrões a que foram acostumados. Leia, a seguir, entrevistas com os autores do livro.
Entrevista/João Borzino
Em que medida a sexualidade ganha e perde pelo fato de ser cada vez mais enquadrada como questão de saúde/doença, desvinculando-se de tabus e preconceitos, mas também de um caráter mais afetivo e até mesmo poético?
Na minha opinião só perde, pois as pessoas vinculam cada vez mais a fórmulas cientificistas de “geração saúde”, achando que podem resolver sua vida sexual com conselhos, medidas comportamentais e medicamentos. Esquecem do caráter “tabu” e de todo o seu poder massacrante sobre a sexualidade humana, que fica reprimida. Perdem a chance de entender que a sexualidade tem uma fisiologia que depende, na maioria das vezes, de como o indivíduo se enxerga, ou seja, somos a única espécie que adota um comportamento social baseado no aspecto moral-ético e por isso sofremos tanto com nossa sexualidade. A questão de saúde pode ser resumida a: tudo que faz bem para o coração, faz bem para o sexo e vice-versa.
“O que quer, afinal, uma mulher?” A famosa pergunta de Freud, quase cem anos atrás, ainda mobiliza terapeutas e aflige os homens?
Sem dúvida nenhuma. Mas hoje as principais atingidas são elas mesmas. As mulheres queimaram sutiãs, estudaram, conquistaram o mercado de trabalho e ainda não estão felizes, não se encontraram. Em pesquisa recente, de acompanhamento de milhares de mulheres por 30 anos, a conclusão foi de que o grau de satisfação empírico da mulher moderna é inferior ao das vovós. Os homens têm dificuldade de entender o perfil feminino ainda mais hoje, pois as mulheres são muito contraditórias em seu dilema entre amante x parceira laborial; mãe x trabalho/jornada dupla; mãe x mulher. A sexualidade continua sendo um tabu e reprimida nas mulheres, mesmo que falem o contrário.
João Borzino é médico e terapeuta sexual. Define seu trabalho como uma “abordagem diferenciada num campo de especialidade médica ainda pouco conhecido dos que mais podem se beneficiar do que têm para oferecer”.
Em um mundo com tanta oferta e liberdade sexual, como explicar a prostituição?
A prostituição é a prova de que a liberdade sexual não passa de fachada. A intimidade e a verdadeira realidade sexual das pessoas são muito mais tristes e frustradas do que se imagina.
A mulher é de fato bem mais propensa do que o homem a “discutir a relação”?
Sem dúvida. Mulheres são muito mais afetivas e intuitivas; gostam de compartilhar os sentimentos, valorizando a relação em si e suas nuances. Homens são objetivos e diretos; sentem que provêm a relação com infraestrutura e proteção, o que fortalece os laços. Somos complementares, não iguais. São as diferenças que nos complementam e nos selecionaram, e é bom que continue assim.
Entrevista/Edvaldo Pereira Lima
Como surgiu a ideia do livro?
O dr. João Borzino e eu somos amigos. Um dia ele comentou que tinha uma ideia de escrever um livro, mas precisaria de ajuda para isso. Como o estilo diferenciado como ele exerce a sexologia tem afinidade com valores que também cultivo e nos quais acredito, achei que daria uma boa parceria desenvolvermos essa ideia juntos, como um projeto profissional. Sugeri o estilo, a abordagem, a estrutura, e ele concordou. Fomos realizando entrevistas, gravando-as em áudio, planejadas em torno dos tópicos que dariam estrutura de conteúdo ao livro.
O livro é estruturado como “entrevista de compreensão”. Pode explicar este conceito?
Trata-se muito mais de um diálogo entre um repórter e uma fonte de informação do que de uma entrevista no sentido técnico usual no jornalismo. O sexo é um assunto orgânico, natural e vital, altamente relevante na vida das pessoas. Por força, porém, da contaminação emocional, moral e tudo o mais que cerca o sexo e a sexualidade na sociedade, há muita confusão e muita angústia em como as pessoas lidam com esse fenômeno. Particularmente o homem sofre muito e em silêncio, quase sempre, por essa ideia distorcida de que o ser humano masculino tem de ser forte e durão. E sofre muito mais ainda no campo da sexualidade tanto pela imposição machista da performance infalível quanto pela exigência cada vez mais crescente das mulheres que esperam dos homens um comportamento muito mais sedutor, amoroso e integral do que reduzidamente genital. Daí a razão da escolha da “entrevista de compreensão” como o recurso narrativo por excelência do livro.
Edvaldo Pereira Lima, professor aposentado da Universidade de São Paulo, integrou o Núcleo de Epistemologia do Jornalismo na Escola de Comunicações e Artes da USP. É professor de jornalismo literário, criador do método “escrita criativa” e autor de 12 livros.
Como o jornalismo literário se insere no cenário de profundas transformações decorrentes da internet e das redes sociais?
A tecnologia narrativa que faz parte da tradição do jornalismo literário se direciona a um propósito universal, a busca de compreensão da realidade. Essa busca se dá em todos os tipos de temas que o jornalismo literário escolhe para abordar, daqueles do campo da política à arte, do esporte à economia, do comportamento à ciência. O modo de fazer isso consiste em contar histórias da vida real centradas em figuras humanas que vivem na pele os acontecimentos e as situações. Quando começou, o jornalismo literário estava presente apenas nos jornais e nas revistas impressas, assim como nos livros, na segunda metade do século 19. Quando surgiram o rádio, a televisão e o cinema, essa tradição narrativa encontrou formas de se adaptar aos novos canais. Com o despontar da internet e das redes sociais, o jornalismo literário segue sendo capaz de se ajustar aos novos meios, como vemos hoje em sites e blogs, por exemplo, em revistas digitais, igualmente.
Diante dessas mudanças, que perspectivas poderia apontar para os jornalistas e para os grandes veículos de comunicação?
O propósito da comunicação jornalística não pode ser mais, exclusivamente, o de informar. Precisa partir para a contextualização e a compreensão. As pessoas precisam receber muito mais conteúdos que remetam à compaixão, à integração e à transformação positiva. Estão cansadas de que enviem as mentes para o beco sem saída do negativismo e da destruição consciente ou inconsciente que poluem a base subjetiva da maior parte das mensagens da mídia.
Livro: Nem Sapo Muito Menos Príncipe – Sexualidade Masculina – Diálogo para Homens e Mulheres/Autores: Edvaldo Pereira Lima e João Borzino/Editora: Clube dos Autores/Páginas: 98/Preço: R$ 34,40 (versão impressa)/R$ 13,39 (e-book)/Mais informações: http://www.clubedeautores.com.br/
Nos idos Anos 60, uma repórter fez a seguinte pergunta ao beatle George Harrison: Paul McCartney é conhecido pelas suas composições, John Lennon pelas letras irreverentes, Ringo pela coleção de anéis e você George, como quer ser lembrado?
Ao que ele respondeu: Se meu dinheiro sair ao final do mês, eu prefiro ficar anônimo.
Assim estamos, nós, homens, na atual conjuntura demagógica, humanoide consensual.
Tamos nem aí…