[Curadoria de Luís Araujo Pereira]
[1]
Lorca
Federico
Caminhou
Pelo mundo
Feito um sol
Ele pedia que os grilos fizessem
Bosques sonoros de amor
Que as formigas estrelas do chão
Olhassem sempre pro céu
Ele pedia às cigarras pra não
Desencantarem o som
Que os rouxinóis imitassem a voz
De um poeta mais triste que Deus
Iras, doçuras, tristezas sem fim
Até Sevilha em Granada morreu
No talismã transparente do olhar
O coração desandou
A cantar, a brilhar
Luzes quebrando os vitrais
Onde o sol não tem pressa
Federico
Navegou
Pelo mundo
Feito um mar
Ele ensinava os caminhos das mãos
Aos barcos soltos sem cais
Fontes com sede de lábios de mel
Dão de beber ao calor
Ele queria viver pra encantar
O desencanto de amar
Talvez pedisse aos piratas do amor
Pra naufragar a carência da paz
Balas, fuzis, assassinos demais
Até Sevilha em Granada chorou
E o poeta passava por nós
Por entre sinos e reis
A tocar corações
Um anjo negro a dormir
Onde o sol não desperta
Federico
Navegou
Pelo mundo
Feito um sol
1987. Melodia: F. Perillo/Écio Duarte
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[2]
Cidade dos sonhos
Cidade dos sonhos
Alegres, tristonhos
Cidade de amores
De fotossensores
Cidade concreta
Careta e discreta
Que nunca tem cores
Nos elevadores
Cidade arquiteta
De art-déco
Cidade moderna
Do interior
Por aqui as avenidas
Acabaram com os quintais
Fizeram becos sem saída
Sem poder voltar atrás
Muda o tempo, o dia, a lua
Muda o sol, a noite e a luz
E a cidade continua
Entre prédios e urubus
1997. Melodia: Écio Duarte
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[3]
Veredas
O meu sertão tem moradia
Por entre serras e luar
Navega à noite e à luz do do dia
Da água-doce à beira-mar
O meu sertão é companhia
Não é saudade de um bem
Não é tristeza ou alegria
É ter alguém sem ter ninguém
Vida vai, vida vem, vida vaga
A porteira divide o que é meu
Passa boi, também passa boiada
Passa a vida de quem já morreu
O sertão não conhece chegada
É um rastro de lua no breu
Parangolé
Andar com fé
Outro mês, outra vez, outro longe
O sertão tá em todo lugar
Onde a dor muitas vezes se esconde
Onde o amor não espera chegar
O sertão não pergunta aonde
No sertão é preciso encontrar
Parangolé
O que ele é
É Riobaldo, é Diadorim
São as veredas de Minas Gerais
Pode ser bom ou ser muito ruim
Ser da Bahia e também de Goiás
“Onde as árvores pegam poeira”
“No barra-beira ou nas cabeceiras”
É do tamanho do mundo é pra lá
O coração é que sabe onde está
2006. Melodia: Fernando Perillo
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[4]
Confissões
Eu passei pela vida me olhando
Refletido no espelho do tempo
De um lado os amores guardados
Do outro jogados
Num só coração
Eu passei muito tempo pensando
Como a vida divide meus sonhos
Numa parte um anjo sagrado
Na outra profano
Na mesma oração
E descobri
Nas fronteiras do amor que eu mais cruzei
Sem olhar pra trás
Sem voltar atrás
Só seguindo meu coração
Entre o sal da saudade e o sol da solidão
Já provei
Dos dois
Já sofri
Demais
E mereço
Ser feliz
2020. Melodia: João Caetano
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[5]
Da metade o dobro
Nem tudo que é arte eu gosto
Nem tudo que parte cola
Nem tudo que apoio, posto
Não gosto de dar esmola
Nem tudo que é arte é arte
Nem tudo que posto, apoio
Nem tudo que cola, parte
Nem tudo que eu vejo, olho
Eu amo da metade o dobro
Eu dobro a esquina ao meio
Não pago por amor, nem cobro
Não gosto que me ponha arreio
2020. Melodia: Pedro Luís
Perfil
Nasr Fayad Chaul nasceu em 30 de maio de 1957 na cidade de Catalão (GO). É professor titular aposentado da Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás (UFG). Doutor em História Social pela USP, publicou diversos livros e artigos sobre a História de Goiás, entre os quais sobressaem os seguintes: Caminhos de Goiás: Da construção da decadência aos limites da modernidade (1997), Coronelismo em Goiás: Estudos de casos e famílias (1998), A construção de Goiânia e a transferência da Capital (1999) e Goiás: Identidade, paisagem e tradição (2001). É membro da União Brasileira de Escritores (UBE), seção de Goiás, sócio emérito do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG) e ocupante da cadeira 3 da Academia Goiana de Letras (AGL). Atua como gestor cultural. Como compositor, tem mais de 200 músicas gravadas. Em 2023, lançou os CDs Goyaz e Pra descansar o coração, com diversos parceiros musicais, entre eles João Caetano, Fernando Perillo, Pádua, Écio Duarte, Gustavo Veiga, Marcelo Barra, Genésio Tocantins, José Eduardo Morais e Celso Galvão.